Quinta-feira, 12 de Novembro de 2009
Kozuhiro Nogi/AFP/Getty Images
Senna levou a Honda para a McLaren: benefício para Prost,
para Dennis e para si mesmo
Por Márcio Madeira da Cunha
A grande maioria dos
analistas automobilísticos concorda que a melhor maneira de comparar
características de dois pilotos distintos é colocando-os para correr num mesmo
time. No entanto - e aqui parece estar o grande erro de avaliação amplamente
cometido - ilude-se quem imagina que através deste procedimento seja possível
eliminar da equação o fator equipe. Defender uma mesma escuderia não significa,
por definição, dispor de igualdade de condições. Este é o primeiro ponto
crucial.
O segundo ponto é que existem
vários fatores dentro do ambiente de trabalho de um piloto que vão muito além
do equipamento recebido. Noutras palavras, mesmo que uma determinada equipe
tenha meios (e interesses) para proporcionar a seus dois pilotos equipamentos
virtualmente iguais, ainda assim restará considerar o tratamento direcionado a
cada um. Este é outro fator decisivo.
Lançados os pressupostos,
podemos então mergulhar no contexto que uniu Ayrton Senna e Alain Prost sob o
mesmo teto nos anos de 1988 e 1989.
Anthony Fosh/Antsphoto
Prost tirou lições de 1984 e logo superou os campeões
Niki Lauda e Keke Rosberg
Em teoria, a McLaren não
precisava de Senna. Afinal, Prost havia superado tanto a Niki Lauda quanto a
Keke Rosberg nos anos anteriores, e no processo havia assegurado dois títulos
mundiais de pilotos em quatro anos. Torna-se desnecessário especular quem será
o melhor piloto do mundo quando se tem um piloto que está perfeitamente
integrado ao time, e que irá vencer sempre que tiver um carro compatível em
mãos. Esta era a situação exata de Prost.
No entanto, a McLaren
precisava dos motores Honda, e a forma embaraçosa como os carros da Williams
haviam deixado a concorrência comendo poeira ao longo de 1987 deixava isso
claro como água. No fim do ano anterior, inclusive, Ron Denis e Alain Prost
chegaram a ir ao Japão tentar um acordo, porém sem sucesso. E naquele momento
Ayrton já havia se tornado, na prática, um piloto Honda. A rigor, a melhor
definição que já li a respeito é a de que, em 1988, Alain Prost pilotava para a
McLaren, usando motores Honda. E Ayrton Senna pilotava para a Honda, usando
carros McLaren.
Talvez esta colocação nos
permita compreender que Senna, portanto, entrou na McLaren pela porta da
frente, graças à longa relação de confiança estabelecida com os japoneses - por
iniciativa própria - junto à mais cobiçada fornecedora de motores daquela
época.
DPPI
Senna havia conquistado o Sr. Soichiro Honda em meados de
1986, ainda na Lotus-Renault
Mais do que seus nada
desprezíveis serviços, portanto, o brasileiro oferecia à equipe a chance de
dispor do melhor motor do mercado. E o que era tão bom quanto: este mesmo motor
seria tirado justamente da Williams, time que teria uma temporada cambaleante
com os improvisados motores Judd V8 aspirados.
Todo este pacote,
evidentemente, tornou muito mais forte a presença de Senna dentro da McLaren, e
desenhou a conjuntura que lhe garantiu a retaguarda política necessária para
desafiar Prost dentro de sua própria casa. Não tivesse sido assim, e nem toda a
velocidade do brasileiro teria sido suficiente para inverter a lógica dos
fatos. Nunca é demais, portanto, lembrar que Ayrton atingiu esta condição
através de méritos próprios, ao entender que o caminho para uma carreira
vencedora passava por atitudes que iam muito além de sua pilotagem.
Passados mais de vinte anos,
Alain Prost gosta de dizer que poderia ter vetado a ida de Senna - e não o fez.
Difícil mensurar a verdade por trás de tal afirmação, dado o valor de barganha
garantido pelos propulsores nipônicos. Certo é que, se Prost optou por não usar
seu poder de veto, com certeza não foi pela alegada razão de que a ele interessava
apenas o fortalecimento da McLaren. A verdade é que, se Prost algum dia teve
tal poder, não o usou porque queria muito correr com os melhores motores do
mercado. E porque o francês, em seu íntimo, tinha a absoluta certeza de que
poderia bater Senna ou qualquer piloto em condições de igualdade.
F1 Facts
Jacarepaguá 1988: Prost vence facilmente; Senna larga do box
e é excluído
Além disso, Ron Dennis
certamente não poderia ver com maus olhos a presença de um desafiante que
pudesse, eventualmente, reduzir um pouco o papel estratégico de cada um de seus
pilotos. Eles que guerreassem, enfim, contanto que os interesses da equipe fossem
preservados.
E a guerra começou no Brasil.
No dia 01 de abril de 1988, quando os carros ganharam o saudoso traçado de
Jacarepaguá para a 1ª das sessões classificatórias da temporada, Alain Prost
foi apresentado ao primeiro e único companheiro de equipe sensivelmente
superior em termos de rapidez e velocidade com o qual teve de conviver em sua
longa e vitoriosa carreira.
Mas havia, é claro, o outro
lado da moeda.
Não é preciso especular muito
para se ter a certeza de que Ayrton Senna, em seu corner, também tinha a
absoluta certeza de que poderia vencer Alain Prost, mesmo dentro da McLaren,
caso tivesse para isso equipamento e tratamento equivalentes. O que Senna não
sabia, ainda, era a complexidade da guerra na qual estava se metendo. E que, em
diversos momentos, rapidez e velocidade simplesmente poderiam não bastar.
Prost, afinal, havia perdido um título para Niki Lauda em 1984, apesar de ter
sempre sido mais rápido que o companheiro. O francês havia aprendido, com o
melhor mestre e da maneira mais dolorosa, que havia sim uma infinidade de
alternativas para a luta.
XPB
Imola 1988: Domínio brutal da McLaren MP4-4: Senna em 1º;
Prost, que largou mal, em 2º
Mas é claro que esse tipo de
expediente só viria à tona um pouco mais tarde. O convívio entre ambos estava
apenas começando, e Alain ainda iria levar algum tempo até entender e aceitar
que simplesmente não era rápido o bastante para enfrentar Ayrton com armas
convencionais. Senna, por sua vez, também precisaria de algum tempo até
compreender que estava jogando um jogo muito mais complexo, e lidando com um rival
muito mais preparado do que aparentava.
Esta primeira fase do
convívio durou exatamente duas corridas. Tanto no Brasil como em Imola, ambos
não travaram batalhas diretas. Por diversas razões, o GP de Mônaco daquele ano
se tornaria o primeiro grande marco da maior rivalidade vista pelo
automobilismo moderno.
FONTE PESQUISADA
A chegada: Senna se junta à McLaren em
1988, pronto para enfrentar Prost. Disponível em: <http://ultimavolta.com/formula1/japao89/especial_japao_1989_texto_02.html>.
Acesso em: 21 de janeiro 2014.
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