Adelaida, 7 de novembro de 1993. Havia um clima de nostalgia no austero boxe da McLaren naquele último grande prêmio da temporada. Mas só Jo Ramirez, coordenador técnico da escuderia, viu as lágrimas nos olhos de Ayrton Senna, na formação do grid do GP da Austrália de 1993, o da última largada do brasileiro pelo time inglês.
“O Jo é um chantagista”, acusou Senna, ao me revelar os apelos feitos pelo mexicano, minutos antes da luz verde.
Ramirez murmurou no ouvido de Senna que toda a equipe era grata pelo que o piloto já havia feito pela escuderia, desde 1988. Era tricampeão e foi quem mais deu vitórias à McLaren; foram 34 em seis temporadas.
“Mas aquele 35º triunfo seria muito especial”, salientou Jo. Não apenas pela despedida de Senna da escuderia – ele já tinha assinado com a Williams –, mas se vencesse a corrida a McLaren somaria 104 vitórias, superando a Ferrari pela primeira vez na F-1, com 103 até ali. “Você será um herói”, previu o mexicano, torcendo pelo
sucesso do seu piloto, naquele grande prêmio muito especial.
Foram necessárias três largadas para a corrida iniciar. As duas abortadas mexeu com Senna, temeroso pela reação da bateria, porque, em velocidade baixa, como na volta de apresentação, a bateria consome muita energia e o motor pode apagar.
Outro cuidado de Senna na partida foi ficar com um olho em Alain Prost, ao seu lado na primeira fila, e outro no retrovisor, atento aos movimentos de Damon Hill, que largaria logo atrás dele, com o segundo Williams-Renault.
“Afinal, aquela foi a minha única pole position do ano, e eu não queria desperdiçá-la”, comentou Senna no depoimento que me ditou depois da prova.
Visto de perto, oculto pelo macacão grosso e colorido, sob o capacete amarelo e a máscara incombustível, Ayrton Senna me parecia de outra galáxia. Dentro da máquina, que transformava numa ferramenta mágica, ele só se satisfazia quando atingia o limite total.
Era assim que Ayrton Senna partia para a pole position. Unia a sensibilidade de gênio com a frieza mecânica, sincronizando o pulsar do coração com os 15 mil giros do motor, para domar o bólido de mil cavalos e ganhar a posição de honra do grid. Um privilégio técnico que ele transformou quase em hábito e conquistou 65vezes. Quando teve carro, emplacar a pole position foi mera rotina, e derrotá-lo virou troféu para os adversários.
Certa vez, Senna me confessou que o medo de largar espremido no meio do pelotão, despertou-lhe a obsessão do primeiro posto no grid e, muita vez, foi além do que julgava ser o seu limite para conquistá-lo.
Ayrton, como de hábito, saiu bem naquela última largada da temporada de 1993. Partiu na frente e rumou para seu último show nas ruas de Adelaide. Só deixou a liderança quando parou para trocar os pneus na 23a das 79 voltas da prova. Retomou a ponta na 29a e cruzou a bandeirada rumando para um pódio único e histórico. Com ele subiu Alain Prost, o tetracampeão, que se aposentava naquela corrida, e Damon Hill, um futuro campeão. Ayrton Senna da Silva consagrava, depois de 158 grandes prêmios disputados até ali, a sua 41a vitória. Uma façanha que o mundo nunca mais testemunharia.
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