sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Ayrton Senna Comemora Título Pelas Ruas de São Paulo


O HERÓI EM CASA


"Quem quiser superar Senna terá de inventar uma maneira completamente nova de correr.”
O elogio do tricampeão Niki Lauda era apenas uma das homenagens que a Fórmula 1 e a imprensa mundial rendiam a Senna naquele final de 1991. De Buenos Aires, o pentacampeão Fangio dizia estar certo de que Ayrton o ultrapassaria em número de títulos, por ser um jovem que tinha "a alma nas corridas". No Brasil, no entanto, o problema era convencer o pai de Senna de que era hora de uma grande festa:
- Senhor Milton, o cara é tricampeão do mundo. Precisamos fazer aquela chegada para ele!
Com este argumento, o publicitário Petrônio Corrêa Filho começou a convencer Milton da Silva a mudar de idéia e autorizar uma festa de recepção que teve até escolta de jatos da Força Aérea Brasileira. Ao ser consultado, ainda na Austrália, sobre a idéia, Ayrton concordou, com uma ressalva:
- Caminhão de bombeiro, não! Só se eu morrer.
A solução foi uma BMW 730 com teto solar, emprestada para a festa. Senna chegou a São Paulo no próprio avião, pilotado por Owen, que fora buscá-lo em Buenos Aires, escala entre Austrália e Brasil. Dois caças F5-E da FAB escoltaram o jato de Senna no espaço aéreo brasileiro, e um dos pilotos leu, pelo rádio, mais uma mensagem do presidente Collor, carregada de patriotismo e orgulho cívico.

Depois de ser recebido na pista pela mãe e pela prefeita Luiza Erundina, Ayrton entrou na BMW e liderou uma caravana que passou pela sede paulista do Banco Nacional antes da celebração montada no Museu da Imagem e do Som. 



Ali, foi às lágrimas com as imagens e referências teitas à sua infância no bairro de Santana.
Para quem se incomodou com a festa, vendo nela uma tentativa de se repetir o ufanismo mistificador de outros tempos, Fernando Gabeira, ex-guerrilheiro e ex-participante do boicote da esquerda brasileira à campanha da seleção na Copa do México, em 1970, durante a ditadura militar, escreveu, num artigo publicado pela Folha de São Paulo no dia 8 de novembro, que Senna estava "lavando a alma de milhares de torcedores" e recuperando "um pouco o ânimo perdido, na sucessão de crises econômicas e baixarias políticas":
"Volta aos anos 70? Embora a cerimônia para saudar o herói que volta tenha semelhanças formais com a chegada da seleção brasileira, o quadro agora é diferente. Em 1970, um governo militar tentava se legitimar através da identificação com os grandes craques do futebol. O governo de agora foi o que mais teve votos na história do Brasil e, além do mais, conhece, pela sua familiaridade com o marketing, como seria difícil explorar demais uma vitória nas pistas de corrida.”
Doze anos depois da conquista de Ayrton, Carlos Augusto Montenegro, diretor-presidente do Ibope, comparou a audiência das corridas de Fórmula 1 na época de Senna, de 35 a 40 pontos, dependendo do momento do campeonato, à do mais importante noticiário da tevê brasileira, o Jornal Nacional, no ano 2000. E lembrou que as transmissões ficaram de tal modo integradas à cultura brasileira, que "o domingo só começava depois da corrida":
"O fenômeno fica ainda mais claro quando se analisa a audiência das corridas de Senna pelo share, ou seja, pela porcentagem entre os aparelhos ligados: 70 a 80%. Uma audiência comparável à Copa do Mundo, com uma diferença que acentua ainda mais a importância de Ayrton: na Copa, os jogos eram concentrados e aconteciam de quatro em quatro anos. No caso da Fórmula 1 dos tempos de Ayrton, o fenômeno era o fato de milhões de pessoas terem o costume de ligar a tevê de manhã, no domingo, de três em três semanas.”
Montenegro jamais confundiu Ayrton Senna com Fórmula 1, no que diz respeito aos brasileiros:
"O que deu ibope foi Ayrton Senna, sua postura. Ele estava acima da Fórmula 1.”
Uma pesquisa realizada com leitores do jornal O Globo, um mês depois da conquista do tricampeonato de Ayrton, mostrou que 39,46% deles consideravam Senna o maior ídolo do esporte brasileiro. O segundo lugar da pesquisa era da jogadora de basquete Hortência, com apenas 7,36%, seguida da colega Paula, com 3,01%, dos jogadores de futebol Júnior, com 2,68%, e Bebeto, com 2,34%, e de Nelson Piquet, com 1,67%. Curiosamente, de acordo com a mesma pesquisa, a Fórmula 1, como esporte, ficava apenas em quarto lugar na preferência do público, com 7,02%, atrás do futebol, com 46,49%, do vôlei, com 20,07%, e do basquete, com 11,37%.
Senna era uma exceção espetacular. Pouco se sabia, na sua época, sobre pilotos competentes como Mário Ferris, Egon Hertzfeld, Thales Polis, Belmiro Júnior, Ayron Cornelsen, Luiz Antônio Teleco Veiga e outros pilotos anônimos que tinham voltado da Europa sem conseguir fazer carreira nas pistas. Contratos mal negociados e equipes mal escolhidas costumavam dizimar sonhos e dólares rapidamente. Djalma Fogaça, um dos que foram e voltaram sem conquistas, resumia:
"Se você contar os pilotos que foram lá fora e não se deram bem, enche um jumbo.”
Eles eram quase quatro mil, regularmente inscritos como pilotos de competição na Confederação Brasileira de Automobilismo, naquele ano do tri de Senna. Um deles foi o campeão inglês de Fórmula 3, correndo pela West Surrey Racing, a mesma equipe pela qual Ayrton conquistara o mesmo título, oito anos antes. E também chegaria à Fórmula 1.
Era Rubens Barrichello.

FONTE

Livro: Ayrton, o herói revelado


FONTE PESQUISADA


RODRIGUES, Ernesto. Ayrton, o herói revelado. Edição 1. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2004.


Um comentário:

  1. Me arrepiou o comentário dele: "Carro de bombeiro, não! Só se eu morrer."

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