O piloto francês
foi sempre um adversário para Ayrton Senna
24 de setembro
de 2013 | 13h 31
LIVIO ORICCHIO,
enviado especial - O Estado de S. Paulo
NICE - A Williams
dominou a temporada de 1992 com Nigel Mansell de maneira ainda mais marcante do
que faz Sebastian Vettel, este ano, na Red Bull. Ayrton Senna pilotava para a
McLaren que, claramente, havia ficado para trás em relação a Williams, depois
de vencer os quatro campeonatos anteriores, três com Senna, 1988, 1990 e 1991,
e um com Alain Prost, 1989.
Senna fazia campanha aberta
para ser contratado por Frank Williams, seu grande admirador, em 1992. Mas por
alguma razão o negócio estava emperrado. Senna desconfiava, apenas, do porquê
Frank Williams não lhe chamar para acertar os detalhes do contrato. Ambos
desejavam trabalhar juntos. Senna chegou a dizer: "Na Williams, com seu
carro de outro planeta, eu corro até de graça".
Na sexta-feira do GP da
Bélgica de 1993, dia 27 de agosto, Ayrton Senna esperou os jornalistas
brasileiros fazerem silêncio e disse, revoltado: "O sonho da Williams
acabou. O baixinho assinou lá e exigiu uma cláusula no contrato que lhe permite
vetar o meu nome como companheiro de equipe". Prost havia sido dispensado
pela Ferrari, antes do fim da temporada de 1991, depois de criticar a
escuderia, não correu em 1992 e, com o apoio da Renault, foi contratado pela
Williams.
Frank Williams não queria
aceitar o veto de Prost, mas a Renault era sua parceira, não apenas fornecia o
motor como tinha um envolvimento maior com a escuderia. Contra sua vontade,
Frank Williams agradeceu Senna e lhe disse que ficaria para o futuro.
Sem alternativa, Senna
continuou na McLaren que, para piorar a situação, perdeu a Honda no fim de
1992, pois os japoneses desistiram da Fórmula 1, e correu com um motor Ford
V-8, não oficial da montadora, diante do V-10 Renault oficial da Williams.
"Temos uns 100 cavalos a menos", disse várias vezes Senna.
Naquele dia no paddock do
circuito de Spa Senna falou mais: "O baixinho vai voltar no ano que vem
(1993), vai pegar esse carro do outro planeta e será campeão do mundo pela
quarta vez. Assim fica fácil".
Foi exatamente o que
aconteceu. O que Senna não imaginava é que antes mesmo de garantir
matematicamente a conquista do quarto título Prost anunciaria que iria
abandonar a Fórmula 1, abrindo as portas para Frank Williams recebê-lo em 1994.
DATA HISTÓRICA
Nesta terça-feira, 24 de setembro, faz exatamente 20 anos que Prost anunciou que pararia de correr na Fórmula 1. O francês chegou decidido ao autódromo do Estoril para disputar o GP de Portugal, embora não campeão ainda. Mas seria apenas uma formalidade. Depois de 13 etapas, Prost somava 81 pontos, seu companheiro de Williams, Damon Hill, 58, Ayrton Senna, 53, e Michael Schumacher, Benetton, 42. Ou seja, Prost tinha 28 pontos a mais de Senna.
Naquela época, o vencedor na
Fórmula 1 recebia 10 pontos, o segundo colocado 6, o terceiro 4, o quarto 3, o
quinto 2 e o sexto, 1. Como depois do GP de Portugal restavam apenas as provas
do Japão e da Austrália, Senna teria de ser primeiro no Estoril e ainda vencer
as duas corridas seguintes, somar 30 pontos, para ser campeão. Desde que o
piloto da Williams não fizesse três pontos apenas.
Damon Hill não era
considerado adversário. Sua função específica: contribuir para a escuderia
ganhar o Mundial de Construtores. Foi por isso que Prost anunciou sua retirada
da F-1 mesmo matematicamente não tendo vencido o Mundial.
A corrida confirmou sua
expectativa. Senna abandonou com problemas de motor e o francês da Williams
terminou em
segundo. Venceu Michael Schumacher, com Benetton-Ford, motor
V-8 oficial da montadora.
NA SUA FRENTE, ATÉ ENTÃO, SÓ FANGIO
Como brilhante piloto que era, Prost celebrou o quarto título, com já fizera em Brands Hatch , em
1985, quando ganhou o primeiro Mundial, com McLaren-Porsche, em Adelaide, no
ano seguinte, também com McLaren-Porsche, e em 1989, na polêmica decisão de
Suzuka, época em que foi companheiro de Senna na McLaren.
Agora, na frente de Alain
Prost no ranking dos pilotos com mais títulos havia apenas Juan Manuel Fangio,
com cinco. O legado de Prost registra ainda 51 vitórias e 33 pole positions. O
notável Michael Schumacher viria a ultrapassá-lo, com impressionantes sete
títulos.
Como quatro vezes campeão do
mundo Prost disputaria ainda as duas etapas finais do calendário de 1993, Japão
e Austrália. Senna, mordido até a alma com o desfecho da temporada, pois
liderou parte do campeonato, mesmo com um carro no mínimo menos potente, para
não dizer menos equilibrado que a super Williams de Prost, equipado com todos
os recursos eletrônicos possíveis, ganhou em Suzuka e Adelaide.
Prost classificou-se em
segundo em ambas. O
modelo MP4/7 da McLaren não tinha uma eletrônica tão sofisticada como o FW15C
da Williams, cujo responsável pela área na organização de Frank Williams era o
atual diretor de engenheria da Mercedes, Paddy Lowe.
No dia 7 de novembro de 1993,
depois da bandeirada em Adelaide, Prost deu adeus à Fórmula 1, Senna, a
McLaren, e aquela viria a ser a sua 41.ª e última vitória na competição. O
sonho de correr pela Williams finalmente se realizaria. Mas a FIA cortou todos
os recursos eletrônicos em 1994 e o que sobrou para Senna foi um carro
"inguiável", na declaração dele mesmo.
Ao menos até o GP da
Grã-Bretanha, na metade do ano, foi assim. Senna, no entanto, não conheceu a
nova versão que estreou em Silverstone, estudada por Adrian Newey, o mesmo
projetista da Red Bull, hoje, e que deu a chance de Damon Hill lutar pelo
título na corrida final, em
Adelaide. Senna perdeu a vida no acidente na curva Tamburello
naquele triste 1.º de maio de 1994, ainda na terceira prova da temporada, o GP
de San Marino.
SENNA PUXA PROST PARA O DEGRAU DO VENCEDOR
No pódio da etapa de Adelaide, em 1993, Senna estava no degrau mais alto do pódio e Prost a sua direita, destinado ao segundo colocado. Depois de receberem o troféu, Senna, que não falava com Prost desde a guerra entre ambos na McLaren, em 1989, olhou para o francês e o puxou pelo braço para ficar junto dele, no posto de número 1.
Em 1994, no GP da França,
quarto depois dos acidentes fatais com Senna e Roland Ratzemberger, da Simtec,
em Ímola, Prost deu uma emocionante entrevista ao Estado. Espontaneamente
resgatou a experiência do pódio em Adelaide, em 1993. "Eu procurei Ayrton
naquele ano, quis falar com ele, pedir para esquecermos o que havia passado
entre nós. Já era hora de olharmos para a frente. Hoje vejo que cada um tinha
os seus motivos para reclamar. Mas o que Ayrton fez? Não quis me ouvir, sequer
me deu atenção."
Sua voz carregava profunda
mágoa com o ex-companheiro de McLaren. O mesmo que ele colocou para fora da
pista, em Suzuka, em 1989, para ser campeão. E recebeu o troco, do mesmo Senna,
e também no GP do Japão, no ano seguinte. Um colocou o outro para fora para
serem campeões. Placar dessa luta perigosa: 1 a 1.
Prost explicou a razão de
sentir-se atingido no pódio de Adelaide: "Minha vontade quando Ayrton me
puxou pelo braço era tirar a mão dele do meu braço. Aquilo pareceu para o mundo
que ele tomou a iniciativa de voltarmos a nos relacionar. Sabia que o
respeitava como piloto, embora dissesse a ele que, por vezes, assumia riscos
elevadíssimos, em especial na classificação. E eu sabia que Ayrton me
respeitava porque dizia isso aos outros".
NOVAMENTE AMIGOS
Absorvido o desgaste daquele momento no pódio, Prost, aposentado da Fórmula 1, foi trabalhar como comentarista da TV francesa e ia às corridas em 1994. "Passamos a conversar novamente. Ayrton me dizia da dificuldade que era controlar seu carro. Aquela Williams, me disse, não tinha nada a ver com a que venci o Mundial no ano anterior. E dava mesmo para ver como ele e Damon Hill lutavam com o carro."
No domingo da etapa de Ímola,
antes da largada, Prost se lembra de Senna lhe dizer que Niki Lauda, ex-piloto
três vezes campeão do mundo, comentarista da TV alemã, lhe havia cobrado para
liderar um movimento em nome da segurança. A proibição da suspensão ativa, do
controle de tração, o acelerador eletrônico, o freio ABS, dentre outras
restrições, sem reduzir a potência do motor, havia tornado a Fórmula 1
extremamente perigosa.
"Senna disse-me que iria
fazer algo e que combinara de se encontrar com Lauda naquela semana",
contou Prost ao Estado. "Não deu tempo."
O francês voou para o Brasil
para acompanhar o funeral de Senna e fez questão de empurrar a espécie de maca
onde estava apoiado o caixão lacrado. "Pode não soar verdadeiro, mas eu
admirava muito Ayrton", afirmou Prost, ao Estado.
EQUIPE PRÓPRIA, UM SONHO
Anos mais tarde, em nova entrevista ao Estado, Prost abordou o fracasso do projeto da Prost Grand Prix, seu maior desejo depois de vencer o campeonato da Fórmula
"Não foi um fracasso
como tantos dizem", falou Prost. "Na Fórmula 1, para obter resultado
é preciso que todos estejam profundamente envolvidos com o projeto, ter aquilo
que o inglês chama de commitment. E a Peugeot, que deveria ser nossa parceira,
não foi. E não consegui também o investimento necessário. Não fui bem
compreendido no meu país." A montadora francesa forneceu seu motor para a
Prost Grand Prix em 1998, 1999 e 2000 e também criticou reservadamente a forma
de Prost administrar sua organização de Fórmula 1.
Sobre Prost como dono da
escuderia, Ron Dennis, sócio e diretor executivo da McLaren até o fim de 2007,
homem dos mais competentes, pois começou como mecânico da Brabham e construiu
um império, o McLaren Group, afirmou de forma crítica: "Alain como
proprietário de equipe é um dos maiores pilotos que já passaram pelo meu
time".
FOTOS DE ALAIN PROST
Francês anunciou aposentadoria e abriu espaço para a ida de Ayrton Senna para a Williams
Na década de 1980, o piloto em momento familiar com a esposa, Ann-Marie, e o filho, Nicolas, que atualmente é piloto
Com a vitória na Áustria, o francês ficou mais perto do primeiro título, em 1985
Francês vibra com vitória no GP de San Marino de 1986 - no pódio, Piquet e Berger junto com o francês
Em 1988, Ron Dennis, chefe da McLaren, contou com os dois melhores pilotos da Fórmula 1 na equipe: Prost e Senna
Prost no alto do pódio do GP do Brasil de 1988, junto com Berger e Piquet
Durante a temporada de 1988, Prost e Senna polarizaram a disputa, que só foi definida no penúltimo GP do ano
Com Prost e Senna, equipe da McLaren posa para foto durante o GP da Espanha de 1988, em Jerez de La Frontera
A vitória no GP do Brasil de 1990 foi a sexta do francês no País e foi a primeira dele como piloto da Ferrari
Mansell foi o colega de equipe do francês na Ferrari durante a temporada de 1990
A temporada de 1991 foi ruim para Prost, que não venceu nenhuma corrida e terminou o ano demitido após criticar o carro da equipe
Prost conversa com o então presidente da FIA, Jean-Marie Balestre
No GP do Japão de 1989, uma batida com Senna deu ao francês o terceiro título mundial
No GP do Japão de 1989, uma batida com Senna deu ao francês o terceiro título mundial
Após ficar fora da Fórmula 1 em 1992, Prost retornou no ano seguinte para conquistar o quarto título
Piloto, então na Williams, comemora vitória no GP da França de 1993, em Magny-Cours
Francês liderava o GP do Brasil de 1993 até rodar, sair da prova e deixar a vitória para Ayrton Senna
Na sua última temporada na Fórmula 1 francês conquistou sete vitórias
Prost veio ao Brasil para acompanhar o funeral de Ayrton Senna, em maio de 1994
Já aposentado, Prost atuou como conselheiro técnico da McLaren na temporada de 1996
Francês como chefe de equipe da Prost durante o GP do Brasil de 2000
Niki Lauda e Alain Prost se encontram durante o fim de semana do GP de Mônaco de 2013
FONTE
Estadão
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