Por Marcos Júnior Micheletti
- 07/04/2017 16:46
Terceiro Tempo - terceirotempo.bol.uol.com.br
A estreia de Senna na Lotus
em 1985 em Jacarepaguá foi frustrante, mas traz boas lembranças
A foto que ilustra a crônica
é de 7 de abril de 1985.
Estou em uma acanhada
arquibancada, para ser generoso, no extinto autódromo de Jacarepaguá, no Rio de
Janeiro.
Dizem que o inferno é quente.
Duvido que haja mais calor por lá do que aquele que passei nos três dias em que
estive na cidade.
Um dia antes desta foto cheguei
ao Rio, vindo de São Paulo, após adquirir um pacote turístico para assistir o
GP do Brasil de 1985, que marcaria a estreia de Senna na Lotus. Aquela, preta e
dourada.
É difícil para que alguém que
tenha menos de 30 anos entenda hoje o que seja obter informações em tempos
analógicos.
O mundo existia sem internet,
mas em outra velocidade, em que pese a rapidez com que passaram aqueles carros
diante das minhas retinas naquele fim de semana. A primeira vez que vi carros
de F1 de perto.
Cheguei ao Rio na sexta-feira,
depois do treino livre, portanto, sem qualquer informação do que havia
acontecido, no caso, Elio de Angelis (companheiro de Senna na Lotus) ficado em
primeiro lugar e Senna em segundo.
De ônibus, fui direto para o
hotel, na Barra da Tijuca, pertinho da pista.
"La Cache " era o hotel, na
verdade um ex-motel transformado em hotel que tinha camas redondas e espelho no
teto.
Tirando o clima quase
burlesco do lugar, o ar condicionado funcionava muito bem, o que me fez pensar
em desistir de colocar o "bico" para fora do quarto, mas havia o que
fazer naquela sexta-feira.
A primeira coisa era obter
alguma informação do que havia acontecido.
Não há celular. Não há
computador. No quarto, liguei o rádio, mas somente emissoras FM estavam
sintonizadas.
Assim, e sem TV no quarto,
restava ir à recepção onde havia um aparelho e aguardar o "Sinal
Verde", boletim informativo da Globo apresentado por Reginaldo Leme antes
do `Jornal Nacional´. Foi ali que eu e mais uns vinte malucos por F1 ficamos
sabendo o resultado do treino.
Uma certa decepção no ar para
quem achava que Senna trucidaria De Angelis logo de cara, mas o brasileiro,
depois de um ano espetacular pela Toleman, acabou levando quase sete décimos do
italiano, que já estava no time inglês há cinco temporadas.
Fomos jantar em uma
churrascaria e voltamos ao hotel para descansar e encarar o dia seguinte em que
ficaríamos por horas no autódromo, para o último treino livre a a
classificação.
Mais decepções, com a
liderança de Alboreto (Ferrari) no treino livre e no treino que definiu o grid
e Senna largando em quarto, uma posição atrás de De Angelis. Não vou entrar em
detalhes. Eles estão aqui, em matéria especial que fiz sobre a
prova.
Naquele mesmo sábado, após um
bom banho no confortável "La
Cache " (procurei para saber se ainda existia e não o
encontrei), fomos jantar no Hotel Glória. Um jantar bem legal, o hotel estava
bem caído mas sua arquitetura clássica enchia os olhos e a comida estava
excelente.
Dalí, nosso guia turístico
nos deu duas opções: o manjadíssimo Bondinho do Pão de Açúcar ou voltarmos para
o hotel. Alguns preferiram a primeira opção, poucos a segunda, e uma meia dúzia
de malucos, incluindo eu, sugerimos uma terceira via, o Maracanã, onde naquela
noite jogariam América e Santos pelo Brasileirão...
E lá fomos nós ao verdadeiro
Maracanã, gigante, no meio da torcida do "Diabo", torcer contra o
Santos, em vão, pois o Peixe acabou vencendo por 3 a 2. O público, segundo o
"Almanaque do Santos", de Guilherme Nascimento, foi de 3.490 pessoas.
Eu, um deles...
No dia seguinte, o GP.
Senna abandonou por problemas
elétricos (era o terceiro colocado e certamente subiria ao pódio), Piquet
também ficou fora logo no começo e Prost venceu.
Pior do que a decepção por
conta da jornada de Senna e também de Piquet (havia vários `Piquetistas´no
grupo), foi a superlotação da arquibancada e os sacos de urina arremessados por
aqueles que estavam mais acima.
Eu frequentava estádios desde
os cinco ou seis anos de idade, mas nunca havia visto nada mais absurdo em
minha vida em se tratando de espetáculo esportivo.
Hoje, 32 anos depois, guardo
a camisa preta (da John Player Special) e o boné que aparecem na foto. Ambos me
servem perfeitamente, pois tenho o mesmo peso e altura.
Guardo também uma saudade
enorme do tempo em que embora os carros fossem rápidos, o mundo corria de outra
forma.
Havia ansiedade pelas
informações, o que havia acontecido.
Assistir o Reginaldo Leme na
tevê — hoje um bom amigo, que me chama de "Marcão" —, nos dando
em primeira mão aquilo que havia acontecido no treino, tinha um sabor doce, um
frescor que nenhum whatsapp é capaz de proporcionar hoje em dia...
E é muito bom agora, tanto
tempo depois, ainda assistir o Reginaldo no seu "Sinal Verde", em
outro formato, porque tem de ser assim mesmo, mas sempre perfeito.
E só lamento não ter guardado
o telefone da menina que aparece atrás de mim na foto, a única da nossa
excursão.
Sabia tudo de F1 a mocinha
que estava com um boné igual ao meu...
FONTE PESQUISADA
MICHELETTI, Marcos Júnior. UM CERTO 7 DE
ABRIL, O "SINAL VERDE" DO REGINALDO LEME E A ANSIEDADE POR
INFORMAÇÕES DA F1 ANTES DA INTERNET. Disponível em: <http://terceirotempo.bol.uol.com.br/noticias/um-certo-7-de-abril-o-sinal-verde-do-reginaldo-leme-e-a-ansiedade-por-informacoes-da-f1-antes-da-internet?utm_source=dlvr.it&utm_medium=twitter>.
Acesso em: 07 de abril 2017.
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