Num domingo nublado em Kyalami, na África do Sul,
Rubinho iniciava no dia 14 de março de 1993 a carreira mais longa de um piloto
na história da categoria mais importante do automobilismo
Por Fred Sabino, Rio de Janeiro
14/03/2018 11h59 - Atualizado há 4 horas
Quando o Mundial de Fórmula 1 de 1993 estava para
começar, num domingo nublado em Kyalami, na África do Sul, as atenções estavam
voltadas para o reencontro entre Ayrton Senna e Alain Prost. O francês voltava
à categoria depois de um ano sabático e era o pole position com o velocíssimo
carro da Williams. Já o brasileiro, que confirmara sua participação em cima da
hora, às voltas com negociações de bastidores complicadas, era o segundo no
grid após surpreendente desempenho com a McLaren, a ponto de disputar a pole
com Prost. Mas ninguém imaginava que um garoto de 20 anos que largaria na
sétima fila começaria a carreira mais longeva da história da Fórmula 1.
Há exatos 25 anos, Rubens Gonçalves Barrichello
alinhava sua Jordan-Hart para iniciar uma trajetória que seria marcada por 322
largadas, 68 pódios, 11 vitórias, 15 poles, dois vice-campeonatos mundiais, em
2002 e 2004, e seis temporadas na equipe mais tradicional e famosa do mundo, a
Ferrari. Ninguém passou mais fins de semana guiando um F1 do que Barrichello.
- Nunca imaginei isso tudo! Eu estava ali nas
nuvens, os engenheiros, principalmente o Gary Anderson, estavam feliz com a
minha entrada. Eu cheguei muito bem preparado na F1 apesar da juventude,
preparado em saber desvendar os mistérios de acerto do carro, e querer melhorar
mais. Mas nunca imaginei que seria uma carreira tão legal, e tão longa! Só
tenho a agradecer! - disse Barrichello em entrevista ao GloboEsporte.com.
Rubinho chegou à Fórmula 1 credenciado por cinco
títulos brasileiros de kart, além de ter conquistado também os campeonatos da
Fórmula Opel e da Fórmula 3 Inglesa, e de ter sido terceiro colocado na Fórmula
3000 (o equivalente hoje à F2) em 1992. Barrichello assinou contrato com a
Jordan, que havia tido excelente estreia na F1 em 1991, mas só tinha somado um
ponto no ano seguinte, após problemas com os motores Yamaha. A equipe passou a
usar unidades da Hart, consideradas confiáveis mas sem a mesma potência de
outros motores. Nesse cenário, não foi possível testar o carro com regularidade
na pré-temporada:
- A gente tentou testar duas vezes o carro na
Inglaterra, mas o carro deu problema, e acabou tendo o mesmo problema
hidráulico que teríamos na África do Sul.
No meio das feras!
Barrichello teve recepção calorosa de Ayrton Senna
na África do Sul (Foto: Getty Images)
Em Kyalami, Rubinho sentiu de cara que estava no
meio das feras. Recepcionado pelo ídolo Ayrton Senna nos boxes, ele ainda
dividiria a pista com nomes do nível de Alain Prost, Michael Schumacher, Damon
Hill, Gerhard Berger, Jean Alesi e Riccardo Patrese.
- Era um sonho. Eu estava ali vivenciando tudo. O
Ayrton passou na frente do box para me cumprimentar. A África do Sul era a
minha primeira corrida, o meu pai (Rubão) estava lá, um amigo nosso da família
que sempre me acompanhou, o tio Plínio, estava lá também. Foi uma aventura, mas
na hora que eu sentei no carro, amei aquela pista, aquelas curvas 1 e 2 que
eram tão rápidas... Foi um sonho dividir a pista com eles. Tenho uma cena em
que eu estava dentro do carro olhando a televisão e o Ayrton saindo do box
dele, e aí quando ele passou em frente ao meu box, parei de olhar a TV para
olhá-lo na real. Era um choque entre fantasia e realidade! - relembra.
As coisas pareciam andar bem. Rubinho ficou numa
promissora 14ª colocação entre 26 pilotos, superando o experiente companheiro
de equipe Ivan Capelli, que chegava na Jordan após passagem pela Ferrari. O
brasileiro foi o segundo melhor estreante no grid, perdendo apenas para o nono
colocado Michael Andretti, que pilotava uma McLaren bem mais competitiva.
Barrichello durante a temporada de estreia na F1, em
1993 (Foto: Reprodução)
Na corrida, Barrichello ganhou três posições antes
da primeira curva, mas precisou frear para escapar de uma grande confusão
causada por Hill, e voltou ao 14º lugar. Mas Rubinho aos poucos foi ganhando
posições: subiu para 13º na sexta volta, com 20 voltas já era o décimo
colocado, e chegou a um excelente sétimo lugar, apenas um abaixo da zona de pontuação
da época, na 31ª volta. Foi quando a falta de resistência da Jordan, que se
revelaria o grande problema da equipe durante todo o ano, deixou Rubinho a pé.
- Eu já estava em sétimo, atrás do Berger. Meu carro
inclusive estava melhor do que o dele, com o motorzinho não andava tanto para
passar - a Ferrari tinha um motor mais forte, de 12 cilindros. Mas eu estava
ali saudável e, vendo o resultado da prova, dava para terminar entre os seis
primeiros. Mas a Fórmula 1 é cheia de "ses" - admitiu Rubinho.
Numa corrida com muitos abandonos, Berger acabaria
em sexto lugar mesmo tendo o motor Ferrari quebrado a três voltas do fim. Ou
seja, de fato Rubinho tinha boas chances de pontuar logo na estreia caso
tivesse terminado a corrida vencida por Alain Prost, com Ayrton Senna em
segundo.
Carreira de vitórias, frustrações e longevidade
Mas ainda em 1993, Barrichello marcaria seus
primeiros pontos, com um quinto lugar no Japão. Pilotaria por mais três anos na
Jordan, e depois mais três na Stewart, antes de assinar com a Ferrari. A épica
primeira vitória seria conquistada no GP da Alemanha de 2000, mas, além de
vencer outras provas, Rubinho teria de conviver com a preferência da equipe
italiana por Michael Schumacher, tendo de trabalhar em favor do alemão em
diversas ocasiões.
Rubens Barrichello comemorando a centésima vitória
do Brasil na F1, em Valência (Foto: Agência Getty Images)
Saiu da Ferrari no fim de 2005 e teve anos difíceis
na Honda de 2006 a 2008. Naquele ano, bateu o recorde de corridas na F1 no GP
da Turquia, superando o italiano Riccardo Patrese. Em 2009, Rubinho renasceu na
Brawn GP em 2009, tendo conquistado a centésima vitória do Brasil na F1, em
Valência (Espanha). Barrichello venceu também em Monza, na que é até hoje a
última vitória do país na categoria, e brigou pelo título com o companheiro
Jenson Button até a penúltima etapa. Em 2010 foi para a Williams, equipe pela
qual correu mais duas temporadas.
- Eu amei tudo o que passei. Tive conversas com
outras equipes, tive situações de outras equipes, mas tudo o que vivenciei foi
ótimo para o meu aprendizado, para a minha evolução. E sempre levei um algo
positivo para as equipes. Quando fui repórter da Globo deu para sentir que
sempre deixei as portas muito abertas, mesmo onde não corri. Deixei um ambiente
muito saudável e muito querido. Tem sempre situações em que queríamos que fosse
isso ou aquilo. Mas de todas as dificuldades houve um aprendizado e uma melhora.
Não tenho o que reclamar e só agradecer por esses anos todos na Fórmula 1,
foram sensacionais!
Quarentão forte e feliz!
Rubens Barrichello se emociona no pódio da Stock Car
em Interlagos (Foto: Reprodução)
Hoje, aos 45 anos - Rubinho faz aniversário dia 23
de maio - Barrichello é uma das estrelas da Stock Car, com um título em 2014, e
sete vitórias. "Rato" de autódromos e kartódromos, ama o que faz e
sempre que pode experimenta outras categorias, já tendo corrido na Fórmula Indy
e disputado as 500 Milhas de Indianápolis, além de ter participado das duas
mais importantes corridas de 24 horas do mundo, em Le Mans (França) e Daytona
(Estados Unidos).
Recuperado de um pequeno acidente vascular cerebral
que o fez ficar internado no começo de 2018, Barrichello voltou ao
automobilismo com um segundo lugar na Corrida de Duplas da Stock Car, em
Interlagos. E, pelo visto, Rubinho ainda tem muito a acelerar pelas pistas de
todo o mundo:
- O amor por guiar é o mesmo, se bobear é maior
hoje. Quando você é um piloto de Fórmula 1 muita coisa acontece, muita coisa
sobe, muita coisa desce. Mas é uma vida intensa, de muito trabalho de
patrocinador, mas muito tempo excelente de pista. Foi uma alegria muito grande
passar esses anos todos, só me fizeram mais fortes para hoje em dia. E depois
dessa prova de Stock Car dá para ver o quanto que estou feliz por renascer e
por ter vivido essa vida maravilhosa, com ainda muita coisa para acontecer!
Emocionado, Rubinho comemorar o segundo lugar na
Corrida de Duplas da Stock Car com o português Filipe Albuquerque (Foto:
Fernanda Freixosa / Stock Car)
FONTE PESQUISADA
SABINO, Fred. Após 25 anos da estreia na F1,
Barrichello celebra carreira: "Amei tudo que passei". Disponível em:
<https://globoesporte.globo.com/motor/formula-1/noticia/25-anos-depois-de-estrear-na-f1-barrichello-celebra-carreira-amei-tudo-que-passei.ghtml>.
Acesso em: 14 de março 2018.
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