Perdi em 1994 duas pessoas que amo muito. O que reforça
minha tristeza de Natal. Vou passar o próximo com a cabeça enfiada num
travesseiro.
Nunca fui a terreiro de babalaô, não conheço meus orixás,
não fiz despacho em encruzilhada e jamais sobrecarreguei Iemanjá, a mãe das
águas, com muitos pedidos de fim de ano, mas, brasileira que sou, gosto de usar
branco no réveillon, deposito uma rosa no mar, faço um desejo de coração e
adoro aquela hora dos beijos, abraços e espoucar de fogos. A tristeza que me
invade no Natal explode em pura euforia na virada do ano e, de 1993 para 1994,
em especial, eu tinha tudo o que comemorar. Tudo quer dizer: estava com o
Ayrton em Angra. O resto era acessório.
Até mesmo o tempo, oscilando entre a chuva e o céu estrelado,
não me importava. Sentia-me, mais do que em qualquer outro lugar, em casa.
Viviane, o Lalli (Flávio é o primeiro nome do marido dela) e os filhos foram. O
Leonardo. Os amigos da velha-guarda e de sempre: Israel Klabin, Luiza e o
Braga, muitos outros. O Clube dos Amigos do Béco: Criminoso, com sua namorada,
Magali, Júnior, Gordinho e a mulher, Gisela, Alfredo... Angra era um social só:
muita gente se conhecia, os convites se entrecruzavam, as lanchas circulavam
entre aquelas ilhas como as pessoas circulam entre as mesas dos bares da moda.
O Ayrton sugeriu que fôssemos à festa do Alexandre (a gente o chamava de Xande
Campineiro), depois que me viu arrumada. Queimada do sol dos dias anteriores,
eu carreguei no branco: minissaia, meia, blusa tipo rede de pescador, tênis. O
contraste, sem pretensão, me deixou bonita. Béco foi generoso:
- É um desperdício deixá-la em casa assim. Agarrei-me no
pescoço dele, naquele horário da Cinderela. Lembrei-me de um casal amigo dele
que nos visitou em casa, muitos meses atrás, com uma filhinha que devia ter
seus 5, 6 anos no máximo. Na hora de se despedir do seu ídolo, ela cobriu-lhe o
pescoço de beijos, mil, milhares - a menininha. Ainda desconcertado, Béco
comentou tão logo eles partiram:
- Tanto beijo que eu casava com ela, agora, no ato.
Meia-noite, e a beijoqueira agora era uma meninona de 20 anos; mil, milhares de
beijos no pescoço, sem medo de repetir "eu te amo, eu te amo..." Uma
rosa branca ao mar e um pedido em segredo. Segredo, já não é mais. Pedia que
meu amor por ele não morresse, que ele continuasse sempre a meu lado. Quem sou
eu para dizer que o pedido não se cumpriu?
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