sexta-feira, 7 de junho de 2013

CAMINHO DAS BORBOLETAS - Adriane Galisteu ganha um carro de Ayrton Senna


- O que você ganhou dele ninguém mais vai ganhar: seu amor.
Assim me tenta dar coragem, em suas cartas e bilhetes, a Bebel, amiga nova dessa fase pós-trauma, mas como se fosse amiga desde criancinha. - Levanta a cabeça,  menina.
É o que me bastaria. Mas, no inventário dos bens me deixado por ele, eu declaro aqui, publicamente, que ganhei muito mais. Um montão de coisas subjetivas, impalpáveis e adoráveis. Um dia, ele me surpreendeu com um presente. Tem gente que vai rir. Eu chorei - de felicidade.
Voltei da Hungria para a casa de minha tia. As coisas na minha vida ainda andavam desorganizadas: casa, trabalho, planos para o futuro imediato, tudo meio embaralhado. Um plano, eu tinha, bem banal: comprar um carro. Tenho anotado na minha agenda, dia 17 de agosto de 1993, um elenco de nomes de concessionárias. Fui à luta. Vi um Uno Mille prata, 1991, usado portanto, mas bonitinho, inteirinho. Tinha dinheiro para pagar. Coisa de macho: Ayrton achava que eu não tinha competência para saber se o carro estava mesmo no ponto. Eu batia pé: está tudo em cima. Ele despistou:
- O Alfredo, que trabalha aqui comigo, também andou vendo um carro, dá um tempinho.
Não podia dar tempo algum. Tinha ânsia de sair dali já no meu carro. Só que, vendo que havia um Ayrton Senna nas proximidades, o dono do Uno fez a gentileza: eu dava uma parte do preço, ele me dava dois dias de prazo. Só então a gente fechava definitivamente o negócio. Olhe só o que dizia o meu horóscopo do mês de agosto, recortado de uma dessas revistas: "A vontade de independência será tão grande que vai se irritar com as pessoas que têm maior poder de decisão sobre sua vida. Aproveite este mês para baixar a cabeça de vez em quando, mesmo que seja para fazer valer sua vontade. Você pode perder uma batalha mas pode ganhar a guerra".
Dia 19, prazo vencido. Ayrton me convida para passar no escritório. Às seis e meia da tarde. Subi direto para a sala dele, o Alfredo não estava. Ele, "calma, calma". Alfredo, enfim, aparece, decepcionado:
- Desculpa, Adriane, mas não deu certo. Trouxe um outro, mais velhinho, mas garanto que está bom de motor.
- Bela proposta - ironizei.
Descemos. Esperava por mim um Uno Mille Electronic zero, prata, igualzinho ao que eu queria comprar. Com um buquê de rosas no capô e o detalhe da chapa: DRI 7770. Só faltava laçarote e papel celofane.
- Isso é um presente de agosto.
- Mas por que agosto? - estranhei. - Não é Dia dos Namorados, não é nada...
- Por isso mesmo: não tem data nenhuma. É um presente de agosto.
Enchi o Béco de beijos. Fiquei sem palavras. Entrei como louca no carro e corri para mostrar a minha mãe. Liguei também para a mãe dele:
- Ganhei um carro novinho.
- Ele me contou - disse a Zaza. - Vem cá que eu quero dar uma volta.

Zaza, Bia, a sobrinha mais velha, e eu, lá fomos nós - depois, jantamos todos no apartamento do Pacaembu.

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