segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Acordar no Paraíso


Jornalista e escritor britânico Tom Rubython, autor da excelente biografia de Ayrton Senna, The Life of Senna (A Vida de Senna, 2004), traz novas revelações em seu novo livro “Fatal Weekend (Fim de Semana Fatal), lançado no final de 2015. No capítulo quatro da obra, por exemplo, ele conta detalhes sobre o resort Quinta do Lago, o complexo luxuoso no Algarve, em Portugal, onde Ayrton vivia com Adriane Galisteu e que foi sua última residência. 

Leia o capítulo na íntegra em uma tradução livre para o português:

CAPÍTULO 4

Acordar no Paraíso

O Algarve - Manhã - quinta-feira, 28 de abril de 1994

Ayrton Senna contemplando o sol no último dia na mansão do Algarve, na manhã de quinta-feira do dia 28 de abril de 1994. 

Quinta-feira, 28 de abril de 1994, foi como qualquer outro dia de início da primavera na Quinta do Lago, no Algarve Português, para seu mais famoso residente, Ayrton Senna, que acordou em sua casa ao som de sua governanta portuguesa, Juraci, espremendo o suco de laranja e fazendo o café na cozinha.

O sol brilhava como sempre acontecia no Algarve nesta época do ano. Senna saiu da cama, pegou seu short e uma camiseta e foi direto para fora para uma corrida pela manhã ao redor das dunas de areia do resort e campos de golfe. Ele preferia correr ao meio-dia no calor escaldante, mas como ele estava saindo em uma hora não tinha escolha, para fazer o seu exercício quando podia, naquele dia. Em 1994, ele era sem dúvida o piloto em melhor forma da grelha (grid) depois de um inverno (europeu, verão no Brasil) de treinamento intensivo comandado, em sua casa de praia no Brasil, pelo seu treinador, Nuno Cobra. Enquanto corria fora de casa, ele deixou seu irmão mais novo Leonardo na cama, ainda dormindo.

Senna amava sua casa portuguesa quase tanto quanto sua casa de praia em Angra. Quinta do Lago era seu paraíso europeu e ainda um segredo bem guardado, tanto quanto Senna zelava (sua privacidade). A mansão de paredes brancas e quatro quartos assentada no seu próprio terreno, protegida por muros altos e portões elétricos, dentro de um resort dos sonho de cerca de 2.000 acres. Com campos de golfe de um lado e uma praia do outro, intercaladas por lagos, Senna tinha comprado a casa alguns anos antes e tinha a reformado completamente durante o último inverno.

A casa era gerida por uma mulher conhecida apenas como Juraci, e até mesmo Senna não sabia se ela tinha mais nomes. Ela era um poço de energia permanente na residência e suas funções eram cozinhar, limpar e dirigir (motorista). Ela fazia todas elas admiravelmente.

A Quinta do Lago resort foi inaugurada em dezembro de 1971 por André Jordan, um desenvolvedor de ascendência polonesa misturada com brasileira. O local original tinha 550 acres e era uma fazenda, e a antiga casa sede da fazenda foi reconstruída como um restaurante. A propriedade na orla marítima tinha sido de posse da família Pinto de Magalhães por 300 anos e Jordan contratou um arquiteto talentoso brasileiro chamado Júlio Neves para projetar grande parte da infra-estrutura e transformá-la em um prazeroso paraíso. Somente as pessoas que tinham estado na Quinta do Lago compreendem a atmosfera única e clima. O resort dispõe de um hotel de cinco estrelas, quatro campos de golfe, uma infinidade de bons restaurantes e até mesmo seu próprio clube noturno.

A grande sacada de Jordan havia sido o de construir uma ponte para ligar a praia a propriedade. Ele então convidou o famoso arquiteto William F. Mitchell para projetar um campo de golfe. O resultante foi um sucesso tão grande que em 1976 o Open Português (torneio anual de golf) foi realizado na Quinta do Lago, pela primeira vez.

Em 1987, sentindo uma recessão próxima, Jordan vendeu a Quinta do Lago para o empresário britânico, David Thompson, obtendo um enorme lucro. Thompson havia vendido o seu negócio de alimentos por atacado no ano anterior e tinha o dinheiro e recursos para concluir o desenvolvimento de um padrão muito elevado. Thompson ficou encantado quando Senna comprou uma casa no resort, e ele redobrou (seus esforços) para suprir as suas necessidades.

Sempre que Thompson apresentava (a propriedade) a um potencial cliente, a primeira coisa que mencionava era de que Ayrton Senna possuía uma casa no resort. Parecia adicionar pelo menos 10 por cento ao preço das moradias.

Quinta do Lago deu a Senna o anonimato que ele desejava. Ele nunca foi incomodado lá, e assim era exatamente como ele gostava. Era o único lugar no mundo fora do Brasil que ele se sentia em casa. Foi um completo bônus que muitas das pessoas também falavam sua língua nativa, português.

O logotipo colorido do Resort Quinta do Lago na entrada principal do complexo residencial

Senna se sentia bem a cada vez que passava pelo monumento do logotipo 'Q' com as cores do arco-íris que girava lentamente dentro de uma fonte na entrada principal do complexo. Ele sentia que estava entrando em um ambiente único onde a natureza estava em completa harmonia com seu projeto para um estilo de vida brasileiro na Europa. Seu jardim era uma vista de tirar o fôlego de plantas tropicais exóticas: palmeiras e bananeiras; hibiscus gigantes; acácias; paredes inteiras de buganvílias; e laranjeiras, limoeiros e abacateiros. A área, protegida legalmente desde 1987, era um habitat natural único para mais de 200 aves residentes e migratórias, incluindo um número de espécies raras e ameaçadas. Os lagos eram um repositório rico para crustáceos e outras espécies marinhas.


Entrada da Mansão de Ayrton Senna na Quinta do Lago

Quando queria, ele podia andar de jet-ski ou fazer windsurf nos lagos e correr por horas ao longo das trilhas naturais ou na praia. O clima maravilhoso e belas paisagens faziam a sua rotina fitness mais suportável. E quando precisava de uma vida social ele ia ao clube de golfe, onde os moradores locais e residentes o conheciam, mas, mais importante, sabiam que não deveriam incomodá-lo. Nos restaurantes e discotecas do complexo, as mesmas regras se aplicavam. Senna considerada a empresa de segurança que cuidava do lugar como a sua própria pessoal, e eram tão eficazes para garantir a sua privacidade e segurança que pequenos crimes na Quinta do Lago tornaram-se praticamente inexistentes.

Quando Senna voltou de sua corrida depois de meia hora, ele tomou banho, vestiu-se e arrumou uma pequena mala de viagem para as três noites que ele ia passar em Castel San Pietro, perto de Bolonha. Ele colocou (na mala) um paletó e gravata para um dia de trabalho que tinha pela frente, mas não houve jantares formais ou compromissos naquele fim de semana, por isso, as suas necessidades de roupas eram mínimas. Mas havia uma pequena irritação em sua vida naquela manhã gloriosa. Seu irmão, Leonardo, estava hospedado até domingo e estaria vindo com ele para Imola. Leonardo estava em uma missão de sua família para tentar persuadir Senna a desistir de sua namorada, Adriane. Por várias razões, a família, com exceção de sua mãe, Neyde, que amava o que ele amava, detestava Adriane.


Não foi surpresa que, em 1994, pela primeira vez em sua vida, Senna havia planejado passar a temporada inteira na Quinta do Lago e não voltaria ao Brasil até a temporada terminar.

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Waking Up in Paradise

The Algarve - Morning -Thursday 28th April 1994

Thursday 28th April 1994 was just like any other early spring day at Quinta do Lago in the Portuguese Algarve as its most famous resident, Ayrton Senna, woke in his house to the sound of his housekeeper, Juraci, squeezing orange juice and brewing coffee in the kitchen.

The sun shone as it always did in the Algarve at this time of year. Senna got out of bed, grabbed his shorts and a t-shirt and went straight out for an early morning run around the resort’s sand dunes and golf greens. He preferred to run at midday in the heat of the sun but as he was leaving in an hour he had no choice but to take his exercise when he could that day. In 1994, he was arguably the fittest driver on the grid after a winter of highly regimented intensive exercise at his beach house in Brazil under his trainer, Nuno Cobra. As he ran out of the house he left his younger brother Leonardo in bed, still asleep.

Senna loved his Portuguese home almost as much as he did his beach house at Angra. Quinta do Lago was his European paradise and was still a well-kept secret as far as Senna was concerned. The four-bedroomed white-walled villa sat in its own grounds, protected by high walls and electric gates, in a dream resort of around 2,000 acres. With golf courses on one side and a beach on the other, interspersed with lakes, Senna had bought the house a few years earlier and had it completely renovated during the previous winter.

The house was managed by a woman known only as Juraci, and even Senna didn’t know if she had any more names. She was a one-woman powerhouse in permanent residence and her duties were to cook, clean and chauffeur. She did them all admirably.

The Quinta do Lago resort had been opened in December 1971 by André Jordan, a developer of mixed Polish and Brazilian parentage. The original 550-acre site was a farm, and the old farmhouse was rebuilt as a restaurant. The beach-lined estate had been owned by the Pinto de Magalhães family for the previous 300 years and Jordan commissioned a talented Brazilian architect called Júlio Neves to design much of the infrastructure and to turn it into a pleasure paradise. Only people who had been to Quinta do Lago understood the unique atmosphere and climate. The resort had a five-star hotel, four championship golf courses, a multitude of good restaurants and even its own night club.

Jordan’s genius had been to build a footbridge to connect the beach to the estate. He then asked famous architect William F. Mitchell to design a golf course. The resulting course was such a success that in 1976 the Portugese Open was held in Quinta do Lago for the first time.

In 1987, sensing a recession just around the corner, Jordan sold Quinta do Lago to British entrepreneur David Thompson for a huge profit. Thompson had sold his food wholesaling business a year earlier and had the money and resources to complete the development to a very high standard. Thompson was delighted when Senna bought a house on the resort, and he bent over backwards to accommodate his needs.

Whenever Thompson showed a potential client around, the first thing he always mentioned was that Ayrton Senna owned a house on the resort. It seemed to add at least 10 per cent to the price of the villas.

Quinta do Lago gave Senna the anonymity he craved. He was never bothered there, and that was exactly how he liked it. It was the only place in the world outside Brazil that he felt at home. It was a complete bonus that many of the people also spoke his native language, Portuguese.

Senna felt good every time he drove past the rainbow-coloured ‘Q’ logo statue that rotated slowly inside a fountain at the main entrance to the complex. He felt he was entering a unique environment where nature was in complete harmony with his design for living a Brazilian lifestyle in Europe. His garden was a breathtaking vista of exotic tropical plants: palms and banana trees; giant hibiscus; vivid yellow mimosa; whole walls of bougainvillea; and orange, lemon and avocado trees. The area, legally protected since 1987, was a unique natural habitat for more than 200 resident or migratory birds, including a number of rare and endangered species. The lakes were a rich repository for shellfish and other marine life.

When he wanted, he could jet-ski or windsurf on the lakes and run for hours along the nature trails or the beach. The wonderful climate and beautiful surroundings made his fitness regime more bearable. And when he needed a social life he went to the golf club, where the locals and residents knew him but, more importantly, knew not to bother him. At the restaurants and nightclubs on the complex, the same rules applied. Senna regarded the security firm that looked after the site as his own personal one, and it was so effective in ensuring his privacy and security that petty crime in Quinta do Lago became virtually non-existent.

When Senna returned from his run after half an hour, he showered, dressed and packed a small overnight bag for the three nights he was going to spend in Castel San Pietro near Bologna. He put a jacket and tie on for the day’s work he had ahead, but there were no formal dinners or commitments that weekend, so his clothing needs were minimal. But there was a small irritation in his life that glorious morning. His brother, Leonardo, was staying until Sunday and would be coming with him to Imola. Leonardo was on a mission from his family to try and persuade Senna to give up his girlfriend, Adriane. For all sorts of reasons, the family, with the exception of his mother, Neyde, who loved what he loved, detested Adriane.


It was no surprise that in 1994, for the first time in his life, Senna planned to spend the entire season at Quinto do Lago and not return to Brazil until the season was over.

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FONTE PESQUISADA

RUBYTHON, Tom. Fatal Weekend. 1º Edição. Great Britain: The Myrtle Press, 12 de novembro de 2015.

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