ROBERTO BASCCHERA, de São Paulo
Jornal do Brasil, dezembro 1994
Como vivem os irmãos e pais de Ayrton Senna sete
meses após a morte do piloto
Nos sonhos que perseguem Leonado Senna da Silva, o
irmão Ayrton bate seu Williams a mais de 200 quilômetros por hora num muro de
concreto, o carro rodopia e para. Segundos depois, ao contrário do desastre de
1° de maio em Ímola, na Itália, o tricampeão mundial destrava o cinto de
segurança e deixa rapidamente o cockpit destroçado, tentando se livrar do
possível impacto de outros carros que participam do Grande Prêmio de San
Marino. O sonho – na verdade um grande pesadelo – é a única ligação que o
empresário Leonardo e toda a família Senna da Silva dizem manter com as
corridas de automóveis nesses sete meses que se seguiram à morte do maior e
mais conhecido ídolo do esporte nacional depois de Pelé.
Apesar da tragédia de Ímola, não se pode dizer que
os Senna da Silva abdicaram da emoção da velocidade. Aproveitando a
oportunidade oferecida pelo Salão do Automóvel, na última semana de outubro,
Leonardo arrematou para os momentos de lazer, numa opção aos videogames que
mantém em seu amplo apartamento dos Jardins, um Lamborghini Diablo VT, um
bólido equipado com motor de 12 cilindros e que vai da imobilidade aos 100
quilômetros por hora em pouco mais de quatro segundos. O brinquedo, recomendado
apenas para os iniciados, custa US$ 391 mil, o preço de um bom apartamento na
Zona Sul de São Paulo. "É quase um carro de pista, como eu sempre
quis", afirmou Leonardo, radiante e ao mesmo tempo incomodado com a
descoberta de sua compra.
A irmã Viviane optou por abandonar temporariamente
os clientes de seu consultório de psicologia para se dedicar exclusivamente a
organizar a Fundação Ayrton Senna. Por conta desses compromissos, tem passado a
maior parte do tempo no exterior, representado a família nas centenas de
homenagens que pipocaram em memória do piloto. Quando está em São Paulo, ela é
protegida por uma secretária fiel e pouco humorada, responsável pela triagem da
correspondência e das ligações que chegam ao escritório no bairro de Santana.
Ao fax enviado pelo Jornal do Brasil com um pedido formal de entrevista, Viviane
respondeu tão gentil quanto negativamente. "Devido ao próprio
estabelecimento da Fundação, estou dedicando todo o meu tempo disponível para
isso, não sendo possível atendê-lo no momento."
A família Senna continua vivendo em função de Ayrton
não somente em razão dos inúmeros negócios iniciados pelo piloto, como a venda
dos automóvies alemães Audi e dos eletrodomésticos italianos DeLonghi. Tudo o
que cerca os Senna da Silva continua sendo notícia. Coincidência ou não, a
velocidade permanece como o principal mote. A revista inglesa Autosport trouxe
na edição de duas semanas atrás a informação de que o Grupo Ayrton Senna estaria
estudando a viabilidade econômica de montar sua própria equipe de Fórmula-1. A
família, porém, mantém silêncio sobre o caso – que agita a Europa e desperta a
cobiça de muitos pilotos endinheirados e desempregados pelo mundo.
Os símbolos de status e riqueza que se tornaram
marcas registradas do piloto quando vivo continuam ativos, embora de forma bem
menos cinematográfica. O helicóptero Esquilo utilizado pelo piloto para as
fugas à mansão de Angra dos Reis hoje transporta a família para os fins de
semana na fazenda de Tatuí. O Lear Jet 35, que durante muito tempo serviu como
opção aos aborrecidos vôos comerciais que Ayrton era obrigado a frequentar é o
meio mais prático de levar os executivos da Senna Import em inauguração de
concessionárias Audi pelo país.
A mansão de US$ 4 milhões em Angra ainda serve como
refúgio para Leonardo e amigos nos fins de semana prolongados e de muito calor.
A vida social da família Senna da Silva também mudou, mas não radicalmente. Milton e Neyde, os pais de Ayrton, continuam tão
arredios quanto antes do acidente. Eles se preocupam com assaltos e sequestros,
motivos que levaram o casal a se mudar, há dois anos, da ampla casa da Avenida
Cantareira, Zona Norte, para um apartamento duplex no Pacaembu.
O casal cumpre poucos compromissos, geralmente em
família, e se refugia na fazenda de Tatuí nos fins de semana – foi lá, por
sinal, que Milton da Silva fraturou o fêmur numa queda na sauna, semanas antes
da tragédia de Ímola. Ele não recobrou totalmente os movimentos da perna, mas
já não usa bengala.
Dona Neide continua se dedicando aos assuntos
familiares. A mãe do Senna e a irmã dele sempre andam acompanhadas de motoristas
e seguranças. Milton da Silva voltou a trabalhar na semana seguinte à tragédia
que se abateu sobre a família. Do alto da torre de vidro de 16 andares que
Ayrton construiu no bairro de Santana há três anos, ele continua atuando como
"conselheiro" nos negócios tocados por Leonardo, pelo genro Flávio
Lalli e pelo sobrinho Fábio Machado.
Às saídas noturnas de Leonardo Senna continuam sendo
frequentes. Leonardo frequenta semanalmente a boate Gallery e é uma das figuras
mais requisitadas da casa. Ultimamente, tem requisitado também os bons
restaurantes para divulgar os resultados dos negócios da família, que vão muito
bem, obrigado.
Uma das tarefas mais penosas que se seguiram à morte
de Ayrton foi localizar a modelo e mais famosa namorada do tricampeão. Ela
andava nesses meses todos totalmente reclusa. Portugal? Campinas? São Paulo?
Onde esteve Adriane?
Nos últimos sete meses, Adriane praticamente não
teve contato com a família do ex-namorado, em especial com dona Zaza (como
trata dona Neyde, mãe de Ayrton), mas nega que senha sido simplesmente ignorada
pelos Senna da Silva. Diplomaticamente, justifica a distância com o argumentos
que "perdeu Ayrton depois de um ano e meio, enquanto os pais e a família o
perderam depois de 34 anos". Adriane também não gosta de falar no episódio
do cancelamento, por parte de Leonardo Senna, da conta conjunta que mantinha com
o namorado. "Isso tudo é abobrinha. E ponto final", encerra,
irritada.
FONTE PESQUISADA
BASCCHERA,
Roberto. No vácuo do campeão. Jornal do Brasil, dezembro de 1994, páginas
35 - 38.
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