sábado, 8 de junho de 2013

CAMINHO DAS BORBOLETAS - As lembranças de Adriane Galisteu


Ayrton Senna da Silva, não há quem duvide, foi o mais valente, o mais genial, o mais perfeito de todos os pilotos. Isso, a posteridade se encarregará de guardar. Para mim, quero ficar com a memória do Béco, um campeão da vida. A imagem que me fica, das últimas semanas, das conversas às vésperas da despedida, era a de um ser humano integral e completo. Ainda muito cauteloso no que dizia, ao contrário da ousadia que ele exibia nas pistas - medindo cada palavra com fita métrica, não havia outro jeito. Mas ele se abriu comigo como jamais. Eu mudei, com ele. Ele mudou, comigo. A carapaça tinha derretido. Ele era um homem, com as virtudes, as contradições,  a firmeza e, me permitam, as dúvidas que fazem dessa nossa espécie uma coisa tão especial na ordem da natureza.
Na nossa última viagem a Angra, na semana anterior ao GP do Brasil, ele assistiu, no telão, à transmissão completa da primeira prova da Fórmula Indy - na Austrália, eu acho. Porque a diferença de horário era tremenda e a prova começava de madrugada no Brasil. Ele via tudo o que tinha a ver com corrida em quatro rodas - às vezes, também em duas. Havia os amigos brasileiros na briga, Emerson, Raul Boesel e, é claro, Maurício Gugelmin, com quem ele dividiu casa quando os dois chegaram, com  a cara e a coragem, à Inglaterra, no início dos anos 80, sonhando com a glória no automobilismo. Mas, no caso dele, acompanhar a Indy era paixão pura pelo esporte em si - e o risco da velocidade.
Devastada por um dia de muito calor e esporte, eu me aninhei no colo dele, resignada em saber que ele ia até o fim, e tentei manter os olhos e os ouvidos abertos enquanto ele me dizia uma ou outra coisa que, de repente, me fizeram parar e pensar: espera aí, isso é uma confidência. Ele não diz essas coisas pra ninguém. Ainda mais para alguém que definitivamente não era do ramo.


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