segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Ayrton Senna Sente Medo Pela Primeira Vez


Ayrton sempre foi uma pessoa muito solitária. Era um jovem extremamente maduro e procurou a independência desde muito novo. O campeão saiu da casa dos pais para tentar a sorte nas pistas com apenas 18 anos de idade. A vida dele era o automobilismo, está que se consumia dentro dos boxes de vários autódromos do mundo, em aviões de diversas companhias, em hotéis. Mas ao conhecer Adriane Galisteu tudo mudou, a modelo mudou a vida dele para melhor. Ayrton já não era tão obcecado pelo trabalho, ele passou a se dedicar muito a vida pessoal, a Adriane. Então é natural naquela altura, aos 34 anos, plenamente feliz com Adriane, o casal cheio de sonhos e planos, Ayrton sentir medo pela primeira vez, não querer mais se arriscar. Agora o campeão tinha alguém que o esperava todos os dias, “não era mais um lobo solitário”, conforme os jornalistas italianos diziam ao comentar sobre sua mudança ao conhecer Adriane. Senna esteve a ponto de desistir de correr em Ímola, algo impensável em tempos anteriores, quando ele se dedicava de corpo e alma a essa profissão tão perigosa, principalmente naquela época. Ayrton realmente estava mudado. 

Adriane acredita que Senna sentiu medo em Ímola. Eu acredito também nisso, pois Adriane conhecia Ayrton profundamente e amigos como o banqueiro Braga e o jornalista Celso Etiberê que acompanharam Senna em suas últimas horas de vida, revelaram que o piloto não queria correr em Ímola. Adriane estava  o esperando na casa deles no Algarve, em Portugal, onde começariam uma nova vida. 


Trecho extraído do livro "Caminho das Borboletas" de Adriane Galisteu: 

Mas, que a Zaza (apelido da mãe de Ayrton) me permita, eu conhecia seu filho e sabia quando é que ele tinha seus momentos de oração. Aquela cena que a tevê mostrou, pouco antes do desastre, não foi um deles. Béco rezava em casa, à noite, longe das pessoas - era dono de uma fé recatada e íntima, não fazia o estardalhaço de um militante de púlpito.

Para mim, naquela hora de rosto tenso e mãos cravadas no carro, ele apenas pensava. Pela primeira vez na sua carreira de piloto vitorioso, para quem o triunfo vinha primeiro que tudo, sentiu a fragilidade da máquina e a fragilidade do ser humano. Um homem tinha morrido à sua frente. Um amigo se estourara contra um muro. Até então, o piloto Ayrton Senna sentava no carro e andava no limite.

De repente, outros sentimentos tinham se intrometido na sua vida: susto, surpresa, medo. Medo - que palavra cruelmente realista! Em tantos meses de conhecimento íntimo e profundo, nunca o vi demonstrar qualquer coisa parecida. Ele passou por situações incríveis, bem diante do meu nariz. Nunca se inquietou. Ao contrário,  buscava o perigo. Mas eu falo agora com a sinceridade de quem ouviu, sentiu, viu - e de quem não tem nenhum compromisso a não ser com aquilo em que verdadeiramente acredita. Hoje, assisto de camarote aos que tentam dar a suas próprias mentiras um ar piedoso, quase religioso. Teorias e mais teorias, todas atribuindo a Ayrton  coisas que detestava fazer e negando-lhe aquilo que mais buscava, ou seja, a liberdade.


Ímola era a prova de fogo dele. O tudo-ou-nada da temporada 1994. Ele sabia que tinha de ultrapassar todos os limites, a começar pelos de sua máquina frágil e difícil de dominar. A minha verdade é a de que se viu, enfim, como uma criatura de carne e osso. Os super-heróis não têm medo. As pessoas têm. No dia em que Ayrton Senna pôde experimentar o mais humano dos sentimentos, no dia em que ele definitivamente se completou como ser, a insanidade dos mercadores do perigo veio golpeá-lo na cabeça. Meu Béco, amado e inesquecível, pagou com a vida a escolha de ser aquilo que ele era.

FONTE PESQUISADA

GALISTEU, Adriane. Caminho das Borboletas. Edição 1. São Paulo: Editora Caras S.A., novembro de 1994. 













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