21/10/2015 04h00 - Atualizado
em 21/10/2015 10h45
Com controversa batida logo
na primeira curva do GP do Japão de 90, piloto brasileiro
"deu o troco" no
rival francês por mágoa guardada do desfecho da temporada anterior
Por Túlio Moreira
Rio de Janeiro
Globo Esporte - globoesporte.globo.com
O circuito de Suzuka, a cerca
de 300km de Tóquio, foi um dos lugares mais marcantes da carreira de Ayrton
Senna. Foi no circuito japonês que o piloto da McLaren ganhou seus três títulos
mundiais, em 1988, 1990 e 1991. A conquista do segundo deles, no dia 21 de
outubro de 1990, completa 25 anos nesta quarta-feira e se mantém até hoje como
um dos episódios mais polêmicos da história da Fórmula 1. Em um dos momentos
mais controversos de sua carreira, Senna forçou um acidente envolvendo a
Ferrari do arquirrival Alain Prost logo na primeira curva e acabou com as
chances de o francês conquistar o título. O brasileiro “deu o troco” em uma
manobra de circunstâncias semelhantes feita pelo adversário na igualmente
polêmica decisão da temporada anterior, também ocorrida em Suzuka, quando ainda
eram companheiros na McLaren.
Em 1990, Suzuka foi palco do famoso 'troco' de Ayrton em
Prost, que garantiu o título para o brasileiro (Foto: Getty Images)
O acidente lançou
questionamentos da imprensa e de alguns torcedores sobre a ética de Senna na
Fórmula 1. Mas o episódio também foi visto como uma forma de “desabafo”
encontrada pelo brasileiro, que se sentia perseguido pelo homem mais poderoso
da categoria à época, Jean-Marie Balestre, presidente da extinta FISA, que era
a entidade responsável por organizar os eventos de automobilismo.
Senna e Prost já haviam
interrompido o convívio amistoso que marcou o primeiro ano da parceria e
estavam em pé de guerra na reta final da temporada 1989. No GP do Japão, o
francês provocou uma batida no brasileiro para garantir seu terceiro título.
Senna pediu para que os fiscais empurrassem o carro, parou nos boxes, trocou o
bico e conseguiu voltar para a pista para vencer a corrida, mas o francês
recorreu a Balestre para desclassificar o rival e assegurar o campeonato.
A rivalidade chegou a níveis
extremos após a polêmica decisão de 1989. A situação de Prost ficou
insustentável na McLaren, que manteve Senna e contratou o austríaco Gerhard
Berger, enquanto o francês rumava para a Ferrari. Inconformado com o título
perdido, o brasileiro disparou duras críticas às atitudes de Balestre, que
exigiu um pedido de desculpas público para que o piloto pudesse obter a
superlicença para disputar o campeonato de 1990. Convicto da parcialidade do
dirigente, Senna se recusou a fazer a retratação até o último momento, quando a
McLaren enfim distribuiu um comunicado assinado por ele. Em 1991, Senna revelou
que o pedido de desculpas não havia sido redigido com seu consentimento.
Todo o impasse envolvendo
Prost e Balestre se tornou fonte de uma grande mágoa para Senna, que se sentia
injustiçado. A chance de extravasar a raiva veio na etapa japonesa de 1990.
Prost precisava vencer para conquistar o título. A direção da prova negou a
Senna, pole position, o direito de largar do lado esquerdo, o mais limpo e
emborrachado da pista. Prost, segundo colocado no grid, largou pelo lado de
fora, enquanto Senna seria prejudicado pela sujeira do lado interno da pista. E
o brasileiro, a cerca de 250 km/h, simplesmente não freou para a primeira
curva, como revelaria a telemetria. O campeonato estava decidido, com Ayrton
bicampeão mundial.
Ayrton Senna Alain Prost Suzuka GP do Japão 1990 (Foto:
Getty Images)
Prost disse que, após acidente, sua vontade era "pegar
o capacete e acertar na cabeça" de Senna (Foto: Getty Images)
Os dois carros foram parar na
caixa de brita da área de escape, e os pilotos escaparam sem ferimentos. Autor
do livro "Ayrton, o herói revelado", o escritor Ernesto Rodrigues
descreve com riqueza de detalhes o acidente. Prost ficou furioso com a atitude
de Senna e disse que, ao sair do carro, sua vontade era "pegar o capacete
e acertar na cabeça dele". O francês estava convicto de que Ayrton havia
provocado o acidente de forma deliberada. Em uma entrevista naquele dia, Senna dedicou
o título "a todos aqueles que lutaram contra mim no ano passado e me
machucaram muito”. O brasileiro ainda provocou: “Este ano, está aí a
demonstração para eles de quem é o campeão".
Corrida marcou também a
última dobradinha brasileira na Fórmula 1
A corrida foi vencida por
Nelson Piquet, da Benetton, que foi seguido pelo amigo Roberto "Pupo"
Moreno, que disputou a prova no lugar de Alessandro Nannini, que sofrera um
acidente de helicóptero. Foi a última dobradinha brasileira na F-1 até hoje.
Mas o protagonista da etapa japonesa foi mesmo Senna. O piloto da McLaren
recebeu muitas críticas de jornalistas especializados, mas ficou especialmente
incomodado com os comentários do tricampeão Jackie Stewart, um dos mais
atuantes na busca por melhorias nas condições de segurança da Fórmula 1. O
veterano escocês condenou a manobra de Senna e chegou a dizer que o brasileiro
não tinha "ética nem humanidade". Ao tomar conhecimento dos
comentários, Senna respondeu que "piloto gente não ganha campeonatos ou títulos.
Você tem de ser agressivo".
Nelson Piquet e Roberto Pupo Moreno na última dobradinha
brasileira da F-1, no GP do Japão de 1990 (Foto: Reprodução)
Nelson Piquet e Roberto Pupo Moreno na última dobradinha
brasileira da F-1 (Foto: Reprodução)
Muitos anos mais tarde, Prost
descreveu o que ocorreu no GP do Japão de 90 como o pior momento de sua relação
com Senna. “Eu perdi o campeonato na largada e o fato de ter feito e
reconhecido no ano seguinte que aquilo foi de propósito. Eu sabia que foi de
propósito, mas ouvir aquilo foi muito difícil para mim”, disse o francês, que
só concretizaria o sonho do tetracampeonato em 1993, pela Williams.
No auge da rivalidade, Senna e Prost se chocam no GP de
Suzuka de 1989 (Foto: Getty Images)
Um ano antes, ainda na McLaren, Prost provocou
acidente com Senna no mesmo circuito de Suzuka (Foto: Getty Images)
Nas pistas, o circuito de
Suzuka voltou a cruzar a história de Senna na conquista de seu tricampeonato,
em 1991. Naquela temporada, o brasileiro precisou conter o poderio da Williams
de Nigel Mansell e conseguiu explorar ao máximo sua McLaren para chegar ao GP
do Japão, penúltima etapa, com uma boa margem de pontos. Com 16 a mais que o
rival inglês, Ayrton precisou apenas do segundo lugar para garantir o terceiro
título. Por causa da ampla vantagem, a McLaren solicitou que Senna, a
contragosto, cedesse a vitória para o companheiro Gerhard Berger.
A rivalidade entre Senna e
Prost permaneceria nos anos seguintes. Mas, no encerramento da temporada de
1993, que teve o francês enfim conquistando seu quarto título e Senna como
vice-campeão, um cumprimento entre os eternos rivais no pódio do GP da
Austrália mostrou que os ressentimentos haviam sido superados. Em Adelaide, a
relação mais explosiva do automobilismo mundial finalmente ganhava um desfecho
amigável.
Quando a carreira de Ayrton
foi interrompida de forma precoce, no fatídico GP de San Marino de 1994, a
relação entre os dois já era de amizade e confiança. O brasileiro passou a
telefonar para Prost com frequência, e os dois trocavam confidências e
impressões sobre os novos rumos da F-1. Pouco antes da largada em Ímola, o
brasileiro, pole position, mencionou o antigo adversário em uma mensagem de
rádio para uma emissora de TV francesa, que tinha o tetracampeão como
comentarista para aquela corrida: “Um alô especial para nosso querido amigo
Alain. Nós sentimos sua falta, Alain”. Prost, por sua vez, ficou muito abalado
com o acidente fatal do rival das pistas e esteve presente no enterro do
brasileiro, em São Paulo.
Alain Prost e Ayrton Senna fazem as pazes no GP da Austrália
de 1993 (Foto: Getty Images)
FONTE PESQUISADA
MOREIRA, Túlio. Há 25 anos, Senna dava
"troco" em Prost e se tornava bicampeão da F-1. Disponível em: <http://globoesporte.globo.com/motor/formula-1/noticia/2015/10/ha-25-anos-senna-dava-troco-em-prost-e-se-tornava-bicampeao-da-f-1.html>.
Acesso em: 16 de março 2016.
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