Família de Ayrton Senna
tentou comprar as lembranças e o silêncio de Adriane Galisteu
Por Nirlando Beirão
Conta conjunta bloqueada. O féretro mal tinha
passado
Passado, para ela, é também a família Senna da
Silva. Ela teve de engolir, sozinha, lentamente, a surpresa pelo tratamento que
recebeu no próprio velório em São Paulo, ao pé do caixão do namorado, num
flagrante desrespeito à ocasião e ao morto. Na sua perplexidade, Adriane
Galisteu, que se considerava parte da família, guardou o ressentimento na
geladeira. "Eu estava catatônica", justifica. "Só depois as
cartas que recebi (de fãs e admiradores do Ayrton e seus) e o que li na imprensa me
despertaram de meu torpor." Poderia ter requentado o seu eventual ressentimento e despejado no seu livro. Preferiu elegantemente jogar fora o
prato envenenado. Mas as confidências de amigos que sabiam o que ela
significava para o campeão, viam como ela era tratada na casa dele e depois assistiram
ao triste espetáculo do enterro mostram como o mundo pode dar uma reviravolta,
por nada.
É estranho que irmãos dilacerados pela morte súbita
de alguém tenham tempo e ânimo para fazer uma ligação internacional para
se certificar se a namorada já foi devidamente despachada da casa de veraneiro
no Algarve – isso na mesma noite da tragédia. Felizmente para Adriane Galisteu,
ela tinha tomado a decisão de partir por conta própria. Certa vez, ela deixou
escapar, ela própria, que a família bloqueou sua conta bancária no Brasil –
aquela em que o namorado depositava o dinheiro de bolso para as despesas do
dia-a-dia dela depois que, por insistência dele, o namorado famoso, Adriane
abandonou de vez a profissão de modelo.
Da herança, ela não ficou nem com o troco, embora se
saiba que a mãe do ídolo, dona Neyde – até aquele dia, para Adriane, ela era a
"Záza" –, tocou no assunto dinheiro na conversa de 45 minutos que ela
diligentemente quis ter com a ex-futura nora, no dia seguinte do enterro. Abalou-se
em viajar uma hora de carro até a fazenda de Almeida Braga, em Campinas, onde
Adriane Galisteu buscara o colo de seus protetores, para tentar comprar dela,
por um humilhante pacotinho de dólares que não pagam uma passagem aérea, todas
as suas lembranças do passado. Que ela esquecesse tudo, inclusive que ele a
tinha amado. Em outras palavras: se quisesse, Adriane Galisteu poderia ter
escrito um livro de escândalos. Acabou escrevendo uma love story.
No livro, há numerosas referências a confidências ao
pé do fogão, viagens com a família, noites dormidas com o namorado na casa da
mãe e do pai dele – às vezes, na casa dos pais dele, mas sem ele. Um
psicanalista talvez deduzisse que, até então, a família apenas tolerasse a
namorada como um capricho passageiro do filho e irmão. Deviam estar imaginando
coisa melhor para ele – a futura mãe dos filhos, de preferência uma mocinha
insossa e cordata. Esqueceram-se de combinar com o principal interessado. Pouco
antes de morrer, ele pagou para Adriane Galisteu um curso de imersão total de
inglês no Berlitz de São Paulo. Convidou-a para acompanhá-lo em toda a
temporada européia – aquela que começou exatamente no dia que, para ele,
terminou, em Ímola, no Grande Prêmio de San Marino. Seriam cinco meses de
convivência cotidiana, na casa do Algarve. Os dois, a sós, com os caseiros. Se
isso não se chama casamento, é difícil arranjar outro nome.
*Insossa é sinônimo de: insulsa, insípida, monótona,
tediosa, desinteressante.
*Significado de cordata: Que está em concordância
com; que não se opõe a; que se encontra sempre de acordo.
FONTE PESQUISADA
BEIRÃO, Nirlando. – Eu Adriane Galisteu, 21
anos, solteira... Playboy, São Paulo, p. 82 – 86, dezembro 1994.
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