Trecho extraído do livro “The Life of Senna” escrito
pelo jornalista britânico Tom Rubython
CAPÍTULO 32
Funeral em São Paulo
O longo adeus
O circo da Fórmula 1 deixou Ímola no domingo à noite e na segunda
de manhã em transe. Para alguns, na semana seguinte haviam dois funerais pela
frente. Quando Gerhard Berger chegou à sua casa na Áustria por volta das 21h do
domingo, 1º de maio, ele se isolou. Ele estava sozinho em casa e não falou com
ninguém, como ele se lembra: “Eu não falei com ninguém por dois dias. Eu olhava
o telefone se enchendo de mensagens, mas eu não senti vontade de conversar com
ninguém sobre isso, já que nada poderia mudar as coisas. Eu só queria passar
algum tempo sozinho. Fiquei de fora das conversas por alguns dias e depois voei
para o Brasil para o seu funeral. ”
Alain Prost queria comparecer ao funeral, mas não tinha certeza se
deveria. Ele estava desesperadamente triste, mas também satisfeito por ter
terminado a rivalidade com Senna antes de morrer. Ele lembrou: “Ayrton e eu
tivemos uma história (rixa) tão longa que eu realmente não sabia como o povo
brasileiro entenderia: eles ficariam chateados se eu fosse, chateados se eu não
fosse, ou o que?” Prost voou de volta para Paris na noite do acidente e
Jean-Luc Lagardère, o presidente da Matra, ligou para ele para perguntar sobre
o acidente. A esposa de Lagardère era brasileira e Prost perguntou o que ele
deveria fazer. Lagardère disse a ele que o povo brasileiro ficaria chateado se
ele não fosse.
Julian Jakobi esperou até segunda-feira para voltar a Londres. Ele
arrumou uma muda de roupa e depois voou direto para o Brasil para o funeral.
Ele foi claro sobre o seu papel nos próximos dias: "Porque eu não era da
família, mas eu tinha que manter a família (cuidar, ajudar, guardar a família).
Então, a gente continuou, na verdade, com adrenalina e tudo mais ”.
Josef Leberer havia voltado para a Áustria naquela manhã. Ele
planejava voltar junto com o caixão de Senna para São Paulo, mas não tinha
certeza dos preparativos e esperou em casa por notícias.
Antonio Braga ficou em Bolonha
para fazer os arranjos para devolver o corpo de Senna a São Paulo. As
autoridades de Bolonha se recusaram a liberar o corpo imediatamente, insistindo
em uma autópsia completa. Leonardo da Silva foi colocado no primeiro vôo de
volta a São Paulo para estar com sua família. Sua dor era infinita, agravada
pelo fato de que seu irmão tinha ido para o túmulo com os dois brigados por
causa de Adriane (desentendidos / desentendimentos sobre Adriane).
Adriane Galisteu acordou na
manhã de segunda-feira em transe. Ela dormira muito pouco. Quando ela abriu os
olhos, não sabia se tinha tido um sonho terrível. Ela esperou e rezou que
tivesse sido um sonho. Seu futuro estava em risco. Ela logo percebeu que era o
pior tipo de realidade.
Na segunda-feira, o corpo de
Senna foi transferido para a funerária de Bolonha, de acordo com a lei
italiana. O necrotério estava cercado de fãs. O corpo de Roland Ratzenberger
também estava lá, aguardando sua própria autópsia.
A casa de Braga em Sintra,
Portugal, também foi cercada por repórteres, ansiosos por entrevistar Adriane.
Imagens de fora da casa estavam sendo transmitidas ao Brasil. A mídia do mundo
todo estava interessada na história, à medida que a enormidade do que aconteceu
se instalou. Com a família imediatamente incomunicável, o foco estava todo na
bela modelo loira de 21 anos, que, no que diz respeito à mídia, era efetivamente
a viúva de Senna.
Quando Braga ligou a casa de
Bolonha, Adriane disse que queria vir e ver o corpo de Senna. Ela disse a ele
que sentia uma necessidade desesperada de evidências sólidas, ver com seus
próprios olhos que ele estava morto.
Braga aconselhou-a que não o
fizesse e achou improvável que ela fosse permitida. Ela aceitou o conselho
dele, acreditando que ela seria capaz de vê-lo pela última vez em São Paulo
antes do funeral. No Brasil era tradicional que o caixão ficasse aberto, ou pelo
menos ter um tampo de vidro. O que ela não sabia era que o amasso na cabeça de
Senna e a ferida causada pelo pedaço afiado de suspensão que havia penetrado no
capacete eram desfigurantes. Especialistas em cosméticos se desesperaram em
tentar fazer o rosto dele suficientemente bom. O caixão continuaria fechado.
Com o tumulto do lado de fora
da casa, Braga aconselhou sua esposa Luiza que a melhor opção era organizar uma
coletiva de imprensa improvisada na casa para a mídia e então eles iriam
embora. Adriane concordou em fazê-la. Mas durante a coletiva de imprensa,
Adriane recebeu algumas perguntas macabras, especialmente de jornalistas
brasileiros que haviam ouvido falar sobre o rompimento com a família da Silva e
estavam inseguros de seu status agora que seu namorado estava morto. Uma
jornalista perguntou se ela tinha passagem de ida e volta para São Paulo e quem
pagaria pela passagem. Adriane sentiu como se estivesse sendo vitimada por uma
mídia hostil à procura de histórias exclusivas sobre o drama da morte de Senna.
Ela não estava em condições de suportar isso.
Não era o caso de Miriam Dutra,
que trabalhava para a TV Globo e fora enviada com urgência para cobrir a
história. Dutra era muito simpática a Adriane, que estava claramente em grande
angústia. Depois Adriane perguntou a Dutra se ela poderia ter todas as imagens
do acidente que a TV Globo tinha. Ela queria ver tudo o que pudesse sobre o
acidente.
A segunda-feira (Senna havia
morrido no domingo) veio e foi para a adormecida (entorpecida) Adriane, e ela
foi sedada para ajudá-la a dormir naquela noite. Os sedativos tiveram pouco
efeito, já que Adriane ainda estava atordoada pelos acontecimentos.
Enquanto isso, Antonio Braga e
Galvão Bueno tentavam desesperadamente organizar o retorno do corpo de Senna a
São Paulo. Naturalmente a família queria que voltasse ao Brasil o mais rápido
possível. Eles achavam que isso seria relativamente simples até que as
autoridades italianas dissessem que a autópsia não aconteceria até terça-feira.
O corpo seria libertado naquela noite.
Na manhã de terça-feira, Miriam
Dutra recolheu a filmagem da corrida em vídeo VHS e no dia seguinte enviou-a
por mensageiro a Adriane Galisteu em Sintra. Adriane sentou-se no sofá e ficou
assistindo várias vezes, acompanhada pelas filhas de Braga, Maria e Joanna.
Elas estavam obcecados em descobrir o motivo de seu acidente.
Adriane também telefonou para
Angelo Orsi, o fotógrafo italiano que tirou fotos de Senna depois do acidente.
Adriane sentiu uma necessidade desesperada de alguma prova física de que ele
estava morto. Orsi conseguiu permissão da família para lhe enviar algumas
fotos.
As autópsias de Senna e
Ratzenberger ocorreram, como planejado, na manhã de terça-feira. Foi simples.
As causas da morte não foram mais complicadas do que em qualquer vítima de
acidente de trânsito.
Na hora do almoço, os corpos
foram autorizados a serem removidos. Braga e Bueno trabalharam febrilmente nos
preparativos para levar o corpo de Senna para casa naquele dia. Eles tinham
duas opções: um voo direto com a Força Aérea Italiana ou via Paris com a Varig.
Os italianos ficaram muito felizes em levar o caixão de volta para São Paulo.
No final, os pais de Senna
decidiriam.
De volta a Sintra, Adriane
sentia um vento frio da família Senna em São Paulo. Na segunda e na
terça-feira, tentara telefonar para os pais de Senna. Ela foi informada pela
empregada da família que ambos estavam sob sedação e não podiam ser
perturbados. Depois de um tempo, isso a incomodou, e ela se perguntou o que ela
tinha feito, especialmente porque compartilhara sua dor com Neyde no domingo.
Na tarde de terça-feira, ela foi até (telefonou) o marido de Viviane, Flavio
Lalli, que lhe disse que era uma situação muito difícil na casa da família e
que ele estava tendo dificuldade em conversar com sua própria esposa, que se
despedaçou ao ponto da falta de palavras. Lalli disse a ela que era impossível
alguém ter qualquer tipo de conversa com Milton ou Neyde da Silva. Eles levaram
a notícia pior do que qualquer outra pessoa. Os pais permaneceram sedados e
virtualmente silenciosos, quase inconscientes do que estava acontecendo ao
redor deles.
CHAPTER 32
Funeral in São Paulo
The long goodbye
The Formula One circus left Imola on Sunday evening and Monday
morning in a daze. For some, in the coming week there were two funerals ahead.
When Gerhard Berger reached his home in Austria at around 9pm on Sunday 1st
May, he shut himself away. He was alone in the house and spoke to no one, as he
remembered: “I didn’t talk to anyone for two days. I watched the telephone
filling up with messages but I didn’t feel like talking to anyone about it as
nothing could change things. I just wanted to spend some time alone. I stayed
out of conversations for a few days and then flew to Brazil for his funeral.”
Alain Prost wanted to attend the funeral but he was not sure
whether he should. He was desperately sad, but also pleased he had ended the
feud with Senna before he died. He remembered: “Ayrton and I had such a history
for so long that I didn’t really know how the Brazilian people would perceive
it: would they be upset if I went, upset if I didn’t go, or what?” Prost flew
back to Paris on the evening of the accident and Jean-Luc Lagardère, the
chairman of Matra, called him to ask about the accident. Lagardère’s wife was
Brazilian and Prost asked him what he should do. Lagardère told him the
Brazilian people would be upset if he didn’t go.
Julian Jakobi waited until Monday to fly back to London. He packed
a change of clothing and then flew straight out to Brazil for the funeral. He
was clear about his role in the coming days: “Because I wasn’t family, but I
had to keep the family going. So one kept going, really, on adrenalin and
everything else.”
Josef Leberer had driven home to Austria that morning. He planned
to return with Senna’s coffin to São Paulo but was unsure of the arrangements,
and waited at home for news.
Antonio Braga stayed in Bologna to make the arrangements to return
Senna’s body to São Paulo. The Bologna authorities refused to release the body
immediately, insisting on a full autopsy. Leonardo da Silva was put on the
first flight back to São Paulo to be with his family. His grief was unbounded,
made worse by the fact that his brother had gone to his grave with the two on
bad terms over Adriane.
Adriane Galisteu woke up on Monday morning in a daze. She had
slept very little. When she opened her eyes, she was unsure whether she had had
a terrible dream. She hoped and prayed it had been a dream. Her future hung in
the balance. She soon realised it was the worst kind of reality.
On Monday Senna’s body had been moved to Bologna’s mortuary in
accordance with Italian law. The mortuary was surrounded by fans. The body of
Roland Ratzenberger was also there, awaiting its own autopsy.
The Braga house in Sintra, Portugal was also surrounded by
reporters, anxious to interview Adriane. Pictures from outside the house were
being broadcast back to Brazil. The whole world’s media was interested in the
story, as the enormity of what had happened sank in. With the immediate family
incommunicado, the focus was all on the beautiful 21-year-old blonde model,
who, as far as the media were concerned, was effectively Senna’s widow.
When Braga rang the house from Bologna, Adriane told him she
wanted to come and see Senna’s body. She told him she felt a desperate need for
firm evidence, seen with her own eyes that he was dead.
Braga advised her against it, and thought it unlikely that she
would even be admitted. She took his advice, believing she would be able to see
him for the last time in São Paulo before the funeral. In Brazil it was
traditional for the coffin to be left open, or at least to have a glass top.
What she didn’t know was that the indent to Senna’s head and the wound caused
by the sharp piece of suspension that had penetrated the helmet were
disfiguring. Cosmetic experts were to despair in trying to make his face good
enough. The coffin would stay closed.
With the bedlam outside the house, Braga advised his wife Luiza
that the best option was to stage a makeshift press conference in the house for
the media and then they would go away. Adriane agreed to do it. But during the
press conference Adriane was asked some ghoulish questions, especially from
Brazilian journalists who had heard about the rift with the da Silva family and
were unsure of her status now her boyfriend was dead. One female journalist
asked her if she had a return ticket to São Paulo and who would be paying for
her ticket. Adriane felt like she was being victimised by a hostile media
looking for exclusive stories on the drama of Senna’s death. She was in no
state to withstand that.
Not so Miriam Dutra, who worked for TV Globo and had been
dispatched urgently to cover the story. Dutra was very sympathetic to Adriane,
who was clearly in great distress. Afterwards Adriane asked Dutra if she could
have all the footage of the crash that TV Globo had. She wanted to see
everything she could about the accident.
Monday came and went for dazed Adriane, and she was sedated to
help her sleep that night. The sedatives had little effect, as Adriane was
still stunned from events.
Meanwhile Antonio Braga and Galvao Bueno were desperately trying
to organise the return of Senna’s body to São Paulo. Naturally the family
wanted it returned to Brazil as soon as possible. They thought this would be
relatively simple until the Italian authorities told them the autopsy, would
not take place until Tuesday. The body would be released that evening.
On Tuesday morning, Miriam Dutra collected the footage of the race
on VHS videotape and the following day sent it by messenger to Adriane Galisteu
in Sintra. Adriane sat on the sofa and watched it over and over, accompanied by
the Braga children, Luiza and Joanna. They were obsessed with finding the
reason for his crash.
Adriane also telephoned Angelo Orsi, the Italian photographer who
had taken pictures of Senna after the accident. Adriane felt a desperate need
for some physical proof he was dead. Orsi got permission from the family to
send her some photographs.
The autopsies of Senna and Ratzenberger both took place, as
planned, on Tuesday morning. It was straightforward. The causes of death were
no more complicated than in any road accident victim.
By lunchtime the bodies had been authorised for removal. Braga and
Bueno worked feverishly on the arrangements to get Senna’s body home that day.
They had two options: a direct flight with the Italian Air Force, or via Paris
with Varig. The Italians were quite happy to fly the coffin straight back to
São Paulo.
In the end Senna’s parents would decide.
Back in Sintra, Adriane was feeling a cool wind from the Senna
family in São Paulo. On both Monday and Tuesday she had tried to telephone
Senna’s parents. She was told by the family’s maid that both were under
sedation and could not be disturbed. After a while this annoyed her, and she
wondered what she had done, especially as she had shared her grief with Neyde
on the Sunday. On Tuesday afternoon she got through to Viviane’s husband Flavio
Lalli, who told her it was a very difficult situation at the family house and
that he was having difficulty talking to his own wife, who was shattered to the
point of speechlessness. Lalli told her it was impossible for anyone to have
any sort of conversation with either Milton or Neyde da Silva. They had taken
the news worse than anyone else. The parents remained sedated and virtually
silent, almost unaware of what was going on around them.
FONTE PESQUISADA
RUBYTHON, Tom. The Life of Senna. 1º Edição Sofback. London: BusinessF1 Books, 2006.