domingo, 29 de setembro de 2019

Após acidente de Donnelly, Senna fez reflexão histórica: "Até quando você vai resistir a tudo isso?"

Batida do inglês no circuito de Jerez de la Frontera deixou brasileiro abalado, e, após ver colega no hospital, piloto da McLaren deu depoimento a Galvão Bueno sobre os riscos da Fórmula 1

Rio de Janeiro

28/09/2019 06h00  Atualizado há 15 horas


Getty Images

Um dos momentos mais difíceis da carreira de Ayrton Senna aconteceu num dia 28 de setembro como hoje: em 1990, o brasileiro viu de perto o colega Martin Donnelly ficar entre a vida e a morte após um violentíssimo acidente na curva Ferrari do circuito de Jerez de la Frontera e, depois de ver o inglês em estado gravíssimo no centro médico da pista, fez uma reflexão histórica e inédita até então, numa entrevista a Galvão Bueno que iria ao ar no especial de 40 anos da F1 na TV Globo:

- Quando você vê situações como essa, pensa se... Até quando você vai resistir a tudo isso? Se você vai passar por tudo isso e sair ileso, sair bem, não só fisicamente, mas psicologicamente? Será que depois de tanto sucesso, não está na hora de... dar um tempo?

Martin Donnelly sofreu gravíssimo acidente em Jerez, em 1990 — Foto: Reprodução

Era o treino de classificação de sexta-feira do GP da Espanha, e Donnelly bateu a cerca de 250 km/h num guard rail pessimamente posicionado, com pouquíssima - para não dizer nenhuma - área de escape, sem caixa de brita, nada... Imediatamente, o inglês ficou desacordado, e, numa cena chocante, ficou estirado no meio da pista, com as pernas tortas. Nelson Piquet atravessou sua Benetton para impedir que algum outro carro atropelasse Martin.

Como seu companheiro na equipe Lotus, Derek Warwick, disse tempos depois, não era possível imaginar que Donnelly escapasse com vida. Mas o dr. Sid Watkins, médico oficial da Fórmula 1, agiu com rapidez e destreza. Ressucitou Martin de uma parada cardíaca ali mesmo, e o piloto foi levado para o centro médico. Lá já estava Ayrton Senna, que invadira o local.

Ayrton Senna conversa com Syd Watkins e Jackie Oliver após acidente de Martin Donnelly — Foto: Reprodução

Donnelly teve traumatismo craniano, fraturas na perna direita, clavícula direita, tíbia, fíbula e fêmur da perna esquerda, além de lesões pulmonares e no pescoço. Quando a condição foi minimamente estabilizada, o inglês foi transferido para o Hospital Virgen del Rocio de Sevilha, onde seguiu-se uma longa recuperação.

Enquanto isso, muita coisa se passava na cabeça de Ayrton Senna. Tido como arrojado e destemido, o campeão de 1988 via diante de si um questionamento sobre toda uma trajetória, iniciada com um kart construído pelo pai Milton e empurrado por um motor de um cavalo. Ver Donnelly de perto era, claro, uma preocupação de colega, mas também uma autoanálise.

Ayrton Senna antes de conquistar a pole em Jerez, em 1990 — Foto: Getty Images

Quarenta minutos após a bandeira vermelha, a pista foi liberada. Ayrton cerrou os dentes, entrou de novo na pista e foi o único a baixar o tempo da casa de 1m19 ao cravar o novo recorde do circuito, 1m18s900, contra 1m19s643 do companheiro Gerhard Berger, enquanto Alain Prost foi apenas o quarto, atrás de Jean Alesi.

No sábado, já com as notícias de que Donnelly estava num quadro mais estável, Ayrton fez uma volta ainda mais impressionante: 1m18s387, após desviar por milímetros dos carros de Olivier Grouillard e Nelson Piquet. Quinquagésima pole position na carreira, 0s437 à frente de Alain Prost.

Ayrton Senna abraça pai Milton após conquistar a pole em Jerez, em 1990 — Foto: Getty Images 

Depois de chorar, abraçar o pai Milton e de conversar com os jornalistas, Ayrton fez nova reflexão, em depoimento que foi ao ar no documentário "Senna", em 2011:

- Estava nos boxes quando ouvi que tinha havido um acidente, que era Donnelly, que era ruim, e fui para o local. Um milhão de coisas vieram para a minha cabeça, mas eu concluí que não iria desistir da minha paixão. Eu precisava apenas me controlar, andar e voltar ao carro de novo, fazer melhor do que eu já tinha feito até então. Era a forma de superar o impacto do acidente. Eu não estava pronto para desistir. Era a minha paixão, a minha vida. Ouvi que ele estava fora de perigo, o que era demais dado o que aconteceu, mas aquilo poderia acontecer com qualquer um de nós. Há coisas que você pode calcular, mas outras que são inesperadas. E são essas inesperadas que são mais perigosas... Espero que essas coisas não aconteçam no futuro.

Senna abandonou GP da Espanha de 1990 com problemas no carro — Foto: Getty Images

Senna podia conquistar o bicampeonato em Jerez de la Frontera desde que vencesse a corrida, independentemente do resultado de Prost. Independentemente disso, o francês deveria ganhar a prova ou terminar em segundo, desde que Ayrton não fosse o vencedor.

O brasileiro liderou a prova até a troca de pneus, mas Prost assumiu a liderança após um pit stop mais rápido da Ferrari. Depois, um radiador furado tirou Senna da prova, e o francês venceu, o que adiou a decisão do título para o Japão. Ironicamente, um acidente fortíssimo causado por Senna definiu o campeonato em favor do brasileiro.



FONTE PESQUISADA

SABINO, Fred. Após acidente de Donnelly, Senna fez reflexão histórica: "Até quando você vai resistir a tudo isso?". Disponível em: <https://globoesporte.globo.com/motor/formula-1/blogs/f1-memoria/post/2019/09/28/apos-acidente-de-donnelly-senna-fez-reflexao-historica-ate-quando-voce-vai-resistir-a-tudo-isso.ghtml>. Acesso em: 29 de setembro 2019. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário