sábado, 13 de setembro de 2014

Adriane Galisteu Era Tratada Como Uma Filha Pela Sogra

Adriane e Ayrton

Adriane Galisteu revelou em seu livro "Caminho das Borboletas" que tinha um ótimo relacionamento com a sogra dona Neyde, mãe de Ayrton Senna, o que foi confirmado na biografia de Ayrton "The Life of Senna". O biografo de Ayrton Senna, Tom Rubython, relata no livro que Neyde era a única da família Senna que gostava de Adriane, para ela o que mais importava era ver o filho feliz. Vamos ao trecho do livro:

Ayrton Senna arrumou uma pequena mala para as três noites que ele ia passar em um hotel em San Pietro, perto de Bolonha, ao mesmo tempo competir no Grande Prêmio de San Marino. Não houve jantares formais ou compromissos naquele fim de semana, por isso a necessidade de roupas eram mínimas. Com tudo pronto, ele comentou a Juraci que a vida não poderia ficar melhor do que era naquela manhã ensolarada no Algarve. Mas ele sempre dizia que para as pessoas ao seu redor, lembrando-os todos, e não menos a si mesmo, a sorte que todos deviam estar partilhando com ele que a Formula Um lhe dera.

Mas havia uma pequena irritação na sua vida naquela manhã gloriosa. Seu irmão, Leonardo, estava hospedado até domingo e estaria vindo com ele para Imola. Leonardo estava em uma missão de sua família para tentar convencê-lo a desistir de Adriane. Por vários tipos de razões a família, com exceção de sua mãe Neyde, que amava o que ele amava, detestava Adriane. Eles consideravam-na como pouco melhor do que uma camponesa, e não bom o suficiente para seu filho, o herói do Brasil. A verdade é que era da conta deles, que Senna amava a menina e, provavelmente, pedir-lhe para casar com ele quando este verão terminasse. 


Citações de Adriane Galisteu sobre dona Neyde em seu livro "Caminho das Borboletas":

TRADADA COMO UMA FILHA

Angra passou a ser minha casa - nossa casa. Compartilhei com ele vários lares. Moramos juntos no apartamento da Rua Paraguai, em São Paulo. Dividimos, certas noites, quarto e cama na casa dos pais dele, no Pacaembu, onde a Zaza (apelido da mãe do Ayrton) me acolhia como uma filha e dava colo a muitas das minhas ingênuas confidências de menina de 20 anos. 

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Para nós, o que Angra era no Brasil, o Algarve era na Europa. Há dois anos e meio Ayrton fazia daquele cantinho ensolarado do sul de Portugal o seu mix de refúgio e escritório ao longo de toda a temporada européia - que, com uma ou outra alteração de calendário, coincidia com o período mais agradável de final de primavera, verão e comecinho de outono. De mais a mais, as férias escolares brasileiras, em julho, sempre davam chance para que a família, ou parte dela, se achegasse - como aconteceu em 1993. Pude curtir meus primeiros momentos de verdadeira  intimidade com a Zaza, mãe dele - a quem eu ainda tratava pelo cerimonioso "dona Neide". Intimidade é isso: café da manhã juntas, preparar na cozinha uma comidinha especial para o filho, sair às compras com ela e a Juraci, a caseira. Viver essas coisas banais do cotidiano.

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Descemos. Esperava por mim um Uno Mille Electronic zero, prata, igualzinho ao que eu queria comprar. Com um buquê de rosas no capô e o detalhe da chapa: DRI 7770. Só faltava laçarote e papel celofane.
- Isso é um presente de agosto.
- Mas por que agosto? - estranhei. - Não é Dia dos Namorados, não é nada...
- Por isso mesmo: não tem data nenhuma. É um presente de agosto.
Enchi o Béco de beijos. Fiquei sem palavras. Entrei como louca no carro e corri para mostrar a minha mãe. Liguei também para a mãe dele:
- Ganhei um carro novinho.
- Ele me contou - disse a Zaza. - Vem cá que eu quero dar uma volta.
Zaza, Bia, a sobrinha mais velha, e eu, lá fomos nós - depois, jantamos todos no apartamento do Pacaembu. Nosso convívio na Europa me dava a idéia de fazer parte da família. A Bia - Bix, eu a chamava - era como uma irmã mais novinha. Passamos aquele fim de semana na fazenda de Tatuí e, na volta, acompanhei a Zaza ao shopping. Éramos confidentes de copa e cozinha, do tipo de ficar conversando enquanto se fazem as unhas. Tanto que, depois de levar o Béco ao aeroporto, no Mercedes dele, naquela noite de terça-feira, 24 de agosto, para Frankfurt e, de lá, para o GP da Bélgica, fiz o que achei mais natural: Eu fui dormir na casa dos pais dele, na cama dele.

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Meu Natal, portanto, seria com ele. Zaza, pessoalmente, reiterou o convite. Quatro ou cinco dias antes,  toda a família se deslocaria para a fazenda de Tatuí, e a festa teria o duplo sentido de celebrar a ceia com filhos, sobrinhos, genros, noras e de inaugurar o casarão novo, todo restaurado.

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 A DESPEDIDA

O  pai se retirou (do funeral de Ayrton), mas Zaza estava firme, beijei-a e ouvi dela:  "Quero muito falar com você". Respondi: "Eu também".  Mas não imaginei que no dia seguinte ela já batesse à minha porta. Depois, achei que nunca mais nos veríamos. Estava enganada.

Quando olhei pela última vez para a cova do Béco, eu  lhe disse em silêncio:

- Eu o amo, mas você me deixou, você me faz falta. Daqui para a frente, minha vida será um tormento.

No dia em que tomei coragem, enfim, de ir a nossa casa, na Rua Paraguai, para retirar as minhas coisas de lá, reencontrei a Zaza. Na fazenda do Braga, em Campinas, recebi o apoio de muitos amigos, uma longa e afetuosa visita da Betise, a Birgit, muitas amigas inesperadas e minha mãe, mas eu estava tão sem eixo, sem rumo, havia perdido tão completamente o fio da meada que me abaixei no carro quando fui a São Paulo pela primeira vez, com o motorista do Braga, depois do enterro. Só ver a cidade já me apavorava.

Fui direto ao apartamento, sem buscar minha mãe, como eu tinha prometido. Dona Neide me esperava. Dez dias depois de toda aquela tragédia. Respirei fundo para enfrentar os fantasmas da memória. Subi de elevador. A porta, entreaberta. Tudo igual - e ao mesmo tempo tudo tão diferente! Não havia nem sinal daquela baguncinha que nós dois produzíamos ali. Tudo no lugar. Não havia mais vida ali. Sentamos, a mãe do Béco e eu, no sofá e conversamos uns quarenta minutos. Ela me falou da Bíblia e, por coincidência, do salmo 81 - aquele que o Béco lia e relia. Ela não se conformava. Senti que ia desabar. Tratei de entrar no quarto. Atirava minhas coisas na mala de qualquer maneira, para poupar sofrimento. Quatro malas cheias, no final. Entrei no banheiro, estava do mesmo jeitinho: a escova de dentes dele no mesmo lugar.

Não resisti: pedi a Zaza para guardá-la. Beijei-a e guardei.

O armário dele, presente que eu tinha dado, a gaveta com seu pijama predileto, o mais velhinho, tipo bermuda e camiseta de meia manga, azul-claro. Tinha tudo a  ver com a nossa vida. Fiquei com ele também. Mas o cartão que eu lhe tinha dado de aniversário e que ele pregou na porta, eu fiz questão de dar a dona Neide:

- É seu, fica com você - insistiu ela.

- Não, é dele, portanto fica com a senhora.

Dei as costas a um pedaço grande do meu mundo - e sabia que essa despedida seria também para sempre. Dona Neide me levou até a saída do prédio, nós nos abraçamos, eu chorei tanto, ela chorou tanto, uma no ombro da outra, que os dois porteiros que assistiam à cena também se emocionaram. Quis desanuviar:

- Se me pegarem na estrada, vão achar que sou uma sacoleira - disse eu.

Ela ainda falou sério:

- Adriane, obrigada por ter sido mulher dele e tê-lo deixado feliz. Ele foi muito feliz com você.

- Eu também fui muito feliz com ele.

- Vou rezar por você, vou torcer por você, gosto muito de você.

Peguei-lhe pela mão e disse:

- A senhora ainda vai me ver bem, pode ter certeza disso. De uma forma muito real, sincera, coerente, vou dar um jeito na minha vida.
Chovia muito, me recordo. Cada uma de nós entrou no seu carro. Até nunca mais. Uma página estava virada em minha vida.

Mas, que a Zaza me permita, eu conhecia seu filho e sabia quando é que ele tinha seus momentos de oração. Aquela cena que a tevê mostrou, pouco antes do desastre, não foi um deles. Béco rezava em casa, à noite, longe das pessoas - era dono de uma fé recatada e íntima, não fazia o estardalhaço de um militante de púlpito.

Para mim, naquela hora de rosto tenso e mãos cravadas no carro, ele apenas pensava. Pela primeira vez na sua carreira de piloto vitorioso, para quem o triunfo vinha primeiro que tudo, sentiu a fragilidade da máquina e a fragilidade do ser humano. Um homem tinha morrido à sua frente. Um amigo se estourara contra um muro. Até então, o piloto Ayrton Senna sentava no carro e andava no limite.

De repente, outros sentimentos tinham se intrometido na sua vida: susto, surpresa, medo. Medo - que palavra cruelmente realista! Em tantos meses de conhecimento íntimo e profundo, nunca o vi demonstrar qualquer coisa parecida. Ele passou por situações incríveis, bem diante do meu nariz. Nunca se inquietou. Ao contrário,  buscava o perigo. Mas eu falo agora com a sinceridade de quem ouviu, sentiu, viu - e de quem não tem nenhum compromisso a não ser com aquilo em que verdadeiramente acredita. Hoje, assisto de camarote aos que tentam dar a suas próprias mentiras um ar piedoso, quase religioso. Teorias e mais teorias, todas atribuindo a Ayrton  coisas que detestava fazer e negando-lhe aquilo que mais buscava, ou seja, a liberdade.

Ímola era a prova de fogo dele. O tudo-ou-nada da temporada 1994. Ele sabia que tinha de ultrapassar todos os limites, a começar pelos de sua máquina frágil e difícil de dominar. A minha verdade é a de que se viu, enfim, como uma criatura de carne e osso. Os super-heróis não têm medo. As pessoas têm. No dia em que Ayrton Senna pôde experimentar o mais humano dos sentimentos, no dia em que ele definitivamente se completou como ser, a insanidade dos mercadores do perigo veio golpeá-lo na cabeça. Meu Béco, amado e inesquecível, pagou com a vida a escolha de ser aquilo que ele era.


FONTE PESQUISADA

GALISTEU, Adriane. Caminho das Borboletas. Edição 1. São Paulo: Editora Caras S.A., novembro de 1994. 

RUBYTHON, Tom. The Life of Senna. 1º Edição Sofback. London: BusinessF1 Books, 2006.


JONES, Dylan. The last 96 hours of Ayrton Senna. Disponível em <http://8w.forix.com/senna1994.html>. Acesso em: 30 de novembro 2011.








 



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