Meia dúzia de espectadores, no Cal Center - maravilha para
um filme a dois. A saída, esperava por nós o inferno. Ayrton é dono de uma
paciência oriental para com os fãs mais ansiosos. Mas não tolera o jeitão trêfego
e insolente de uma certa imprensa. Fomos, de repente, sitiados. Ouvimos o
primeiro clique - e ele segurou com força minha mão. Outro flash. Ele quis
dialogar:
- Olha, eu vim aqui em busca de tranqüilidade. Podemos ir
todos embora agora, não podemos?
Enquanto ele argumentava, novo flash. E a perigosa
aproximação de um rapazinho, de bloco e Bic na mão, trazendo na ponta da língua
aquele veneno que só as cascavéis e alguns jornalistas conseguem destilar:
- Essa história da gravidez da Marcella Prado... Afinal, a
filha é sua ou não é?
Tipo da pergunta elegante para um sujeito que tinha uma
namorada ao lado. Pela primeira vez, pressenti que ele ia dar vazão ao seu
pedaço Incrível Hulk:
- Pergunte ao seu pai. - E, antes que o repórter puxasse o
argumento "é meu trabalho", já levou um safanão que o derrubou. Ao
fotógrafo, ele lascou um tapa na orelha que até hoje deve lhe soar como um
telefone ocupado. Arrancou-lhe a máquina e a arremessou contra o vidro do
cinema. Juntou gente e eu não sabia o que fazer. Segurei-lhe na mão, gelada,
que tremia, e tentei arrastá-lo. Mas ele estava transtornado. Voltou atrás
sobre seus passos:
- Me dá o filme.
Fotógrafo e repórter gaguejavam. Passaram-lhe um rolo, que
ele puxou e expôs à claridade. Arremessou contra uma cesta de lixo. Caminhamos
para a porta e ele ameaçou voltar:
- Cachorro! Tenho certeza de que o filme é outro. Era outro.
Um homem capaz de percorrer uma pista tortuosa a 350
quilômetros por hora caminhou até o carro com o rosto respingado de lágrimas, e
ele chorava, chorava, até seu apartamento - chorava de raiva, chorava pela
impossibilidade de ser um mero mortal como os outros, chorava com a
indelicadeza daqueles que fazem de uma profissão bonita um ofício de abutres,
chorava por ser indefeso, chorava por me expor, chorava pelo controle perdido,
arrependido de entrar no jogo dos achacadores de novidades. Mais de uma vez eu
o vi chorar. Nunca de medo. Sempre de raiva. Ele se metia nas brigas e,
depois, se envergonhava. Mas, num mundo de má-fé, a lei dos punhos acaba tendo
de se impor, às vezes. Chorei com ele. Percebi, ali, que já vivia plenamente a
vida dele.
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